Nos estudos das ciências, da astronômia, da astrologia, dos mandamentos, das profecias, das experiências terrestre e até extra-terrestes dos seres humanos – inexplicáveis inscrições nas montanhas dos Andes por exemplo, não se deve deixar de considerar os registros do que já escreveram as civilizações passadas sobre estes diversos assuntos.
Tantas profecias já nos relataram e estas provaram-se sem credibilidade, e felizmente, poucas ou nenhuma, se realizou. Porém, em especial, uma profecia da avançada civilização Maia chama a atenção. Uma profecia dos Maias que na sua milenar experiência de observação do Cosmos registraria que, em nosso calendário gregoriano, no dia 21/12/2012 se dará uma rara e importantíssima mudança no firmamento cosmico, que influenciaria o comportamento dos seres vivos e atingiria todo o planeta Terra. Uma profecia que trata de um tema quase que transcendental, deste, talvez até de outros mundos, por isso merece registro e uma reflexão.
Conforme o calendário Maia de nome e pronúncia esquisita, algo como: tisouqui, o nosso tempo cósmico real atualmente está na Freqüência 12/60, uma freqüência ligada ao materialismo, estariamos no auge do dito popular: Tempo é dinheiro. E seria esta freqüência uma frequência E-R-R-A-D-A (considerando também os 12 meses irregulares do calendário gregoriano). No ano de 2012 o cosmos completará um ciclo importantíssimo para o planeta Terra, assim dizem os Maias acontecerá um raríssimo e duradouro evento cósmico nesta data.
Segundo os chamados engenheiros sincronizadores do tempo Maias apartir do dia 21/12/2012 entraremos na Freqüência do Divino 13/20, uma freqüência cósmica que representaria a mudança dos estados da espiritualidade, dos paradigmas, da harmônia coletiva e principalmente da V-E-R-D-A-D-E.
Em pesquisa pouco encontrei quanto a manifestações escritas dos pensadores sobre o que pensavam desta profecia dos Maias, talvez porque não tivessem interesse, conhecimento ou porque 2012 ainda estaria muito longe dos seus tempos. Segundo relatos a história registra que os povos Maias já teriam acertado algumas de suas previsões dentre elas a que previu o fim de sua própria civilização. Que se deu através de uma brusca e duradoura mudança climática, qual fez com que, antes desta tomassem a decisão de mudarem de dimensão, culminando com o desaparecimento de toda e qualquer ser vivos de suas cidades ou da fase da terra como escrevem alguns.
Felizmente esta Nova Era sintonizada na Frequência do Divino 13/20 diferentemente do que pregam e ou gostariam alguns, não é o apocalipse, a profecia dos Maias não se refere ao Fim do Mundo, refere-se ao Fim dos Tempos. No caso, fim do mundinho de alguns e dos maus tempos para todos, espera-se também fim dos maus carateres. Portanto, que ninguém se aproveite desta profecia para tentar acabar com o Brasil e encher seus bolsos, antes que o mundo acabe.
Desde 2002 nós no Brasil já experimentamos os bons fluídos positivos, humanos e prósperos da influência da Freqüência do Divino 13/20, em 2002 elegemos Luis Inácio Lula da Silva, entraremos em 2012 e continuaremos na freqüência do DIVINO com uma Dilvina 13. Assim estamos sintonizados e prontos para receber os Novos Tempos, só faltando para complementar a sintonia dos cosmos Lula como Conselheiro Presidente do grupo dos 20, o G-20.
De nossa parte vamos ajudar para que esta boa profecia, esta nova frequência prevista pelos Maias seja verdade, vamos entrar neste portal do tempo, da justiça, da vergonha e da verdade.
E para aquele povo acertadamente passado, presente e futuro estavam em uma mesma dimensão, mesma realidade, mesma sabedoria..
Nós dividimos o tempo em começo e fim - dias, semanas, meses, anos, séculos - é o que se foi e o que ainda vira. Para os Maias cada dia tinha o seu significado. A grande importância dada pelos Maias à medição do tempo decorre da concepção que tinham de que tempo e espaço, em verdade, tratam-se de uma só coisa e que flui não linearmente, como na convenção européia ocidental, mas circularmente, isto é, em ciclos repetitivos em volta dos seres. Acredita-se que a civilização Maia criou o calendário mais preciso da história, fazendo uso de cálculos exatos da rotação da Terra e dos ciclos lunar e solar, eles criaram dois calendários: um solar, Haab de 365 dias e meio usual e outro sagrado qual o postado refere-se: O calendário Tzol´kin de 260 dias.
Assim os dois se combinavam para criar ciclos de 52 anos. O Calendário Maia prevê o final do ciclo atual no ano de 2012.
O Tzolkin, a sagrada contagem repetitiva de 260 dias(kins), é a base da contagem longa dos Mayas do grande ciclo da história.
A contagem longa, é claro, parece ser um fênomeno puramente cronológico, marcando a contagem dos dias entre 13 de Agosto de 3113 AC e 21 de Dezembro de 2012 DC. A contagem dos dias, é também representada por uma matriz mestra quadri-dimensional de 13:20.
Os 1.872.000 kins(dias) de duração da contagem longa consistem de 13 sub-ciclos principais chamados baktuns, cada sub-ciclo consiste de 144.000 dias ou kins. Cada um desses sub-ciclos é novamente dividido em 20 sub-ciclos menores chamados katuns, cada um deles consiste de 7200 dias ou kins. E isto também significa que há 7200 ciclos de 260 dias cada em um grupo de 13 baktuns.Acho que é coisa de outro mundo mesmo, pois, as propriedades radiais-fractais da frequência universal 13:20 de sincronização, tem aplicações universais e uniformes. Como alguém lá em 3113 AC já poderia saber disso? A contagem longa Maya já era conhecida do ser humano contemporâneo, mas foi recentemente, que o grande ciclo, como também é conhecido, foi entendido na sua forma fractal modular como a onda harmônica do cosmos.
A Civilização Maya teve seu grande período no décimo baktun, contagem longa 9.0.0.0.0 - 10.0.0.0.0, qual era o seu propósito em criar uma contagem que se originou mais de 3000 anos antes, e mais arrepiante ainda porque seu calendário "termina" em 2012?
O início da contagem dos 13 baktuns, em 13 de Agosto de 3113 AC, (4 Ahau, 13.0.0.0.0), é o máximo de precisão e exatidão que uma pessoa pode calcular como sendo o começo da história: A primeira dinastia egípcia é datada de cerca de 3100 AC; A primeira "cidade", Uruk, na Mesopotamia, também é de cerca de 3100 AC; O Kali Yuga Hindu, data de 3102 AC, e o mais interessante, a divisão do tempo em 24 horas de 60 minutos cada e cada minuto com 60 segundos é também de cerca de 3100 AC na Suméria. Se o começo da história foi tão precisamente definido, então não o seria, o fim da história ou de um ciclo em 21 de Dezembro de 2012? Por isso até o calendário de David Ewing Duncan conclui sua linha do tempo com o fim do grande ciclo Maya em 2012.
Como os Mayas saberiam disso tudo aos 3113 AC, sem a ajuda de alguém mais inteligente, experiente, observador ou avançado?
Quantos ciclos não se precisou viver, presenciar, observar e registrar antes de saber que o ciclo fechava e iniciava-se outro exatamente naquela data de 3113 AC e agora 2012 DC?
Observe que o que é conhecido como Kali Yuga pelos Hindus não é diferente do que este ciclo da história, o qual no final deve retornar à uma nova era dourada. Nas mais conhecidas teologias dos mundos Cristão e Islâmico, o katun final marca o final dos tempos, uma espécie de dia do Juízo Final na Terra, e haveria um critério que seria capaz de distinguir o FALSO - a frequência de sincronização artificial 12:60 com os homens maus sendo condenados - do VERDEADEIRO - a frequência de sincronização 13:20 com os homens de bem sendo absolvidos e reconhecidos no final deste ciclo.
Fonte: Soldadonofront.blogspot.com
Um blog onde se respeita a diversidade religiosa,
o livre pensamento e o direito à expressão.
30 junho 2009
29 junho 2009
ENTREVISTA COM O ATOR E DIRETOR TEATRAL RODRIGO D'OLIVEIRA
Paranaense de Marilandia, Rodrigo D'Oliveira desde os 13 anos descobriu sua vocação para as artes cênicas e acreditando na sua vocação para o teatro nunca mais parou.
Teve em sua formação profissional, orientadores de grande relevância para a dramaturgia brasileira, como Oraci Gemba, Jaime Barcelos e Paulo Autran, que muito contribuiram para o seu desenvolvimento pessoal e profissional.
Uma das experiências mais marcantes de sua vida foi quando em 2000 ao fazer a adaptação para o teatro do livro Nosso Lar descobriu o Espiritismo, a partir daí sua forma de enxergar a vida e o mundo se transformou. Desde então Rodrigo tem usado o seu talento e a sua arte para levar ao grande público a mensagem consoladora e esclarecedora da Doutrina Espírita.
A equipe da Terra Espiritual conversou com Rodrigo D'Oliveira sobre algumas de suas experiências e sobre a peça Nosso Lar e abaixo transcrevemos o teor da entrevista.
TE - Quando foi seu primeiro contato com o Espiritismo e como você resolveu tornar-se espírita?
RO - Faz cinco anos que eu freqüento uma casa espírita em Curitiba, o centro ''Abibe Isfer'' estou muito feliz por fazer parte desta casa que me ensinou muito. Mais tudo começou enquanto eu fazia a adaptação para teatro do livro Nosso Lar, eu comecei a freqüentar um centro espírita que tem sede no campo universitário espírita de Curitiba para fazer um laboratório para montar as cenas da peça, no começo eu ficava muito assustado com tudo o que eu via lá, as manifestações dos espíritos desencarnados, aquilo me deixava apavorado, mais também muito emocionado quando ouvia as palavras de esclarecimentos que os médiuns dirigiam aos desencarnados, eu saía de lá às vezes me sentindo tão despreparado para estar trabalhando numa obra como Nosso Lar, por muitas vezes pensei em deixar isso de lado, demorei muito tempo para terminar, mais eu sentia estar sendo inspirado para continuar depois de tantas duvidas, acabei entrando de cabeça neste trabalho e deixei as coisas acontecerem e realmente aconteceu.
TE - Como nasceu a idéia de montar peças espíritas?
RO - Bem, na verdade a idéia não era montar especificamente peças espíritas, a idéia era abrir um espaço cultural que levasse ao publico peças de boa qualidade, acho que é um dever de quem trabalha com arte, ajudar na educação do mundo, e quando falamos em educação, acho que a educação espiritual esta em primeiro lugar, Quando li as obras espíritas percebi que eu tinha encontrado exatamente que eu queria encenar em meu teatro
TE - Por que escolheu exatamente montar Nosso Lar?
RO - Nosso Lar foi o segundo livro espírita que li o primeiro foi Violetas na Janela eu ia montar violetas mais a editora já tinha cedidos os direitos para a atriz Ana Rosa. Fui a federação espírita do Paraná eles me indicaram Nosso Lar, eu me apaixonei pela obra vi que daria um excelente espetáculo, comecei a adaptação. No inicio tive um pouco de medo achei que as cenas ficariam muito pesadas, também tive medo que a peça se tornasse uma coisa muito doutrinária e isso não poderia acontecer eu tinha recentemente inaugurado meu teatro e isso poderia mudar o rumo das coisas, mais graças a Deus nada disso aconteceu a peça ficou linda e deixou a critica especializada impressionada
TE - A fato das apresentações terem iniciado em 2002 tem alguma relação com o fato de esse ter sido o ano do desencarne de Chico Xavier?
RO - Este fato foi realmente muito marcante no momento em que Chico partiu a gente estava ensaiando e no final do ensaio nos tivemos uma reunião e o assunto principal era a viagem que fazíamos até a casa do Chico para receber dele suas bênçãos para nosso trabalho, o ensaio neste dia era para ser cancelado o Brasil tinha ganhado a copa e estava uma festa na frente do teatro, o barulho estava atrapalhando a concentração dos atores, mais eu senti que algo não deixou que a gente cancelasse o ensaio passamos a peça inteira com a musica da seleção e os gritos das pessoas interagindo com as cenas da peça depois quando chequei em casa liguei a tv e a primeira imagem que vi foi a do adeus ao Chico...e o telefone não parava de tocar era amigos e pais de atores me ligando para saber como eu estava, eles percebiam que havíamos ficado órfãos.
TE - Qual a emoção de encenar uma peça baseada na obra de Chico Xavier e André Luiz?
RO - Nem tenho palavras ... Ainda bem que não esta sendo uma entrevista para tv... Não consigo parar de chorar... Só espero que o Chico e o André estejam tão satisfeitos e felizes o quanto eu estou
TE - O que representa a figura do Chico para você?
RO - Luz para o mundo.
TE - Como a peça influenciou o grupo?
RO - Quando comecei a escolher a equipe que ia trabalhar comigo neste projeto, foi tudo muito difícil, ninguém acreditava no projeto, a classe artística achava uma loucura eu estar inaugurando um teatro com uma peça deste gênero, não consegui diretor, o que consegui foi apenas um assistente de direção e ainda evangélico, acabou me largando sozinho e ainda levando todo o meu elenco, tive que recomeçar tudo de novo. Visitei vários grupos espíritas mais nem um deles aceitou, eu percebia que eles ate sentiam vontade de fazer, mais questionavam muito o trabalho por ser em um teatro independente e não estar filiado a nem um grupo espírita, acabei montando a peça com pessoas que não tinham nem um conhecimento espírita hoje eu compreendo que a espiritualidade maior assim o quis. temos muita disciplina respeito e dedicação pelo que estamos fazendo.
TE - Você tem algum fato curioso sobre a peça para contar?
RO - Uma entidade que se manifestou no final da apresentação da peça quando estávamos completando um ano de apresentação. A entidade se apresentou como sendo um médico com o nome de Dr. Renato ele subiu ao palco muito emocionado abraçou a todos do elenco dirigindo palavras de agradecimentos pelo trabalho que fazemos. Em quase todas as sessões acontecem coisas muito marcantes pessoas que se emocionam muito e saem para recepção chorar, outras que ao termino da peça abraçam os recepcionistas e choram em seus braços. Outro fato muito interessante foi uma temporada que fizemos no teatro são João na cidade da Lapa-PR. este teatro foi no passado um deposito de armas e esconderijo de soldados de guerra muitos morreram exatamente onde é localizado o palco hoje, fizemos três apresentações neste lugar o publico e o elenco se emocionou muito durante a peça sentimos que muitos desencarnados tiveram bons esclarecimentos.
TE - A peça é destinada apenas ao público espírita?
RO - Não. A adaptação foi feita par reflexão sem nem uma pretensão de levar as pessoas a serem espíritas tive o cuidado de não interferir na forma como as pessoas vêem o outro lado da vida. Mais da metade do publico que tem assistido a peça não são espíritas e saem compreendendo a mensagem.
TE - Qual a mensagem que vocês procuram transmitir através da peça?
RO - É uma reflexão, fala sobre como as conseqüências de erros podem interferir no desenvolvimento espiritual de cada um, como as pessoas vêem a vida, e sobre a necessidade de mudá-la para melhor.
TE - Qual a reação do público após a apresentação?
RO - Saem impressionados ...é um silencio total.., alguns abraçam os recepcionistas do teatro e choram em seus braços agradecidos.
TE - Nestes mais de 2 anos de apresentações quais as maiores tristezas e alegrias?
RO - A maior alegria é ver este trabalho acontecendo a tanto tempo, o que é tão raro acontecer em nosso pais principalmente quando é um trabalho feito com recursos próprios sem nem um patrocínio, também a participação do elenco que independente do que vão ganhar, nunca deixou de estar presente como é o caso da atriz Regina Bastos que interpreta o papel da mãe de André Luiz, uma atriz de renome nacional que não mediu esforço, deixou proposta de trabalho muito importante para sua carreira, preferindo estar com a gente em Nosso Lar, sem mesmo ser espírita. Tristezas acho que não tenho muito a reclamar as vezes me entristece ver um projeto como este que pode auxiliar tanto na educação de nosso pais, tendo que ser executado por conta própria sem ter encontrado nem um patrocinador.
TE - Como você avalia a contribuição da arte dentro do movimento espírita?
RO - Acho de grande importância, mais acho mais importante o espiritismo na arte... palco é um trabalho que exige muita entrega, e nem sempre encontramos gente disposta no meio para encarar um trabalho que exige tanta entrega assim, também acho que falando de espiritualidade nos palcos independentes dos meios espíritas e com profissionais da área, não passamos aquela idéia de doutrinação, coisa que muitas pessoas odeiam, é comum a gente ouvir comentários de pessoas que vieram assistir a peça por que tiveram que trazer sua esposa ou vice-versa, e saíram daqui vendo o espiritismo com outros olhos. Acho que as produções de peças espíritas independentes, não tem o compromisso de doutrinar, temos apenas o compromisso de oferecer ao publico um bom trabalho no palco, assim existe uma entrega muito maior dos atores para o entendimento daquilo que estão representando, isso exige um estudo muito profundo para uma boa interpretação.
TE - Existem muitos grupos de teatro espírita, mas poucos conseguiram alcançar o grande público. Qual sua sugestão para que estes grupos alcancem o sucesso que vocês conseguiram?
RO - Bem acho que parte desta resposta esta na pergunta anterior pra completar eu digo aos que desejam ingressar neste projeto que tudo vem a seu tempo, primeiro a semente depois os frutos, os próprios textos espíritas ensinam isso, uma frase que gosto muito é quando Lísias diz a André Luiz é preciso reconhecer que toda a realização nobre exigem três coisas fundamentas primeiro é desejar, segundo saber desejar e o terceiro merecer.
TE - O grupo vai realizar apresentações em Fortaleza e Teresina. Qual a sua expectativa e o que o público pode esperar?
R.O - Estamos viabilizando todas as condições técnicas necessária para que o espetáculo não perca nada do que é apresentado em Curitiba, além de estarmos levando um dos maiores iluminadores do pais o Beto Bruel, estamos também oferecendo tanto em fortaleza como em Teresina uma oficina que vai preparar atores para participação na peça, isso vai valorizar muito as cenas que retratamos as trevas pretendemos colocar o maior numero possível de participante
TE - O que mudou na sua vida após a Doutrina Espírita?
RO - Uma grande mudança, hoje vejo o mundo com outros olhos. Encontrei mais segurança nas coisas que eu faço.
TE - Quais são os próximos projetos?
RO - ''Os mensageiros'' estreou já no festival de teatro de Curitiba realizando 4 apresentações, levaremos depois a cidade da Lapa PR. nos dias 15 e 16 de abril depois volta para Curitiba fazendo longa temporada. É um espetáculo lindo, não tem tanto impacto como Nosso Lar mais é um espetáculo que emociona muito, em seguida quero montar o terceiro livro da série André Luiz.
TE - Pediríamos que você deixasse uma mensagem para os nossos leitores
RO - Que procuremos entender melhor os acontecimentos da vida, não querendo mudar as pessoas de um dia para outro, pois a própria experiência de cada um se encarrega disso,o mais importante é vivenciar o mandamento maior que é ''amor ao próximo''
TE – Obrigado.
Teve em sua formação profissional, orientadores de grande relevância para a dramaturgia brasileira, como Oraci Gemba, Jaime Barcelos e Paulo Autran, que muito contribuiram para o seu desenvolvimento pessoal e profissional.
Uma das experiências mais marcantes de sua vida foi quando em 2000 ao fazer a adaptação para o teatro do livro Nosso Lar descobriu o Espiritismo, a partir daí sua forma de enxergar a vida e o mundo se transformou. Desde então Rodrigo tem usado o seu talento e a sua arte para levar ao grande público a mensagem consoladora e esclarecedora da Doutrina Espírita.
A equipe da Terra Espiritual conversou com Rodrigo D'Oliveira sobre algumas de suas experiências e sobre a peça Nosso Lar e abaixo transcrevemos o teor da entrevista.
TE - Quando foi seu primeiro contato com o Espiritismo e como você resolveu tornar-se espírita?
RO - Faz cinco anos que eu freqüento uma casa espírita em Curitiba, o centro ''Abibe Isfer'' estou muito feliz por fazer parte desta casa que me ensinou muito. Mais tudo começou enquanto eu fazia a adaptação para teatro do livro Nosso Lar, eu comecei a freqüentar um centro espírita que tem sede no campo universitário espírita de Curitiba para fazer um laboratório para montar as cenas da peça, no começo eu ficava muito assustado com tudo o que eu via lá, as manifestações dos espíritos desencarnados, aquilo me deixava apavorado, mais também muito emocionado quando ouvia as palavras de esclarecimentos que os médiuns dirigiam aos desencarnados, eu saía de lá às vezes me sentindo tão despreparado para estar trabalhando numa obra como Nosso Lar, por muitas vezes pensei em deixar isso de lado, demorei muito tempo para terminar, mais eu sentia estar sendo inspirado para continuar depois de tantas duvidas, acabei entrando de cabeça neste trabalho e deixei as coisas acontecerem e realmente aconteceu.
TE - Como nasceu a idéia de montar peças espíritas?
RO - Bem, na verdade a idéia não era montar especificamente peças espíritas, a idéia era abrir um espaço cultural que levasse ao publico peças de boa qualidade, acho que é um dever de quem trabalha com arte, ajudar na educação do mundo, e quando falamos em educação, acho que a educação espiritual esta em primeiro lugar, Quando li as obras espíritas percebi que eu tinha encontrado exatamente que eu queria encenar em meu teatro
TE - Por que escolheu exatamente montar Nosso Lar?
RO - Nosso Lar foi o segundo livro espírita que li o primeiro foi Violetas na Janela eu ia montar violetas mais a editora já tinha cedidos os direitos para a atriz Ana Rosa. Fui a federação espírita do Paraná eles me indicaram Nosso Lar, eu me apaixonei pela obra vi que daria um excelente espetáculo, comecei a adaptação. No inicio tive um pouco de medo achei que as cenas ficariam muito pesadas, também tive medo que a peça se tornasse uma coisa muito doutrinária e isso não poderia acontecer eu tinha recentemente inaugurado meu teatro e isso poderia mudar o rumo das coisas, mais graças a Deus nada disso aconteceu a peça ficou linda e deixou a critica especializada impressionada
TE - A fato das apresentações terem iniciado em 2002 tem alguma relação com o fato de esse ter sido o ano do desencarne de Chico Xavier?
RO - Este fato foi realmente muito marcante no momento em que Chico partiu a gente estava ensaiando e no final do ensaio nos tivemos uma reunião e o assunto principal era a viagem que fazíamos até a casa do Chico para receber dele suas bênçãos para nosso trabalho, o ensaio neste dia era para ser cancelado o Brasil tinha ganhado a copa e estava uma festa na frente do teatro, o barulho estava atrapalhando a concentração dos atores, mais eu senti que algo não deixou que a gente cancelasse o ensaio passamos a peça inteira com a musica da seleção e os gritos das pessoas interagindo com as cenas da peça depois quando chequei em casa liguei a tv e a primeira imagem que vi foi a do adeus ao Chico...e o telefone não parava de tocar era amigos e pais de atores me ligando para saber como eu estava, eles percebiam que havíamos ficado órfãos.
TE - Qual a emoção de encenar uma peça baseada na obra de Chico Xavier e André Luiz?
RO - Nem tenho palavras ... Ainda bem que não esta sendo uma entrevista para tv... Não consigo parar de chorar... Só espero que o Chico e o André estejam tão satisfeitos e felizes o quanto eu estou
TE - O que representa a figura do Chico para você?
RO - Luz para o mundo.
TE - Como a peça influenciou o grupo?
RO - Quando comecei a escolher a equipe que ia trabalhar comigo neste projeto, foi tudo muito difícil, ninguém acreditava no projeto, a classe artística achava uma loucura eu estar inaugurando um teatro com uma peça deste gênero, não consegui diretor, o que consegui foi apenas um assistente de direção e ainda evangélico, acabou me largando sozinho e ainda levando todo o meu elenco, tive que recomeçar tudo de novo. Visitei vários grupos espíritas mais nem um deles aceitou, eu percebia que eles ate sentiam vontade de fazer, mais questionavam muito o trabalho por ser em um teatro independente e não estar filiado a nem um grupo espírita, acabei montando a peça com pessoas que não tinham nem um conhecimento espírita hoje eu compreendo que a espiritualidade maior assim o quis. temos muita disciplina respeito e dedicação pelo que estamos fazendo.
TE - Você tem algum fato curioso sobre a peça para contar?
RO - Uma entidade que se manifestou no final da apresentação da peça quando estávamos completando um ano de apresentação. A entidade se apresentou como sendo um médico com o nome de Dr. Renato ele subiu ao palco muito emocionado abraçou a todos do elenco dirigindo palavras de agradecimentos pelo trabalho que fazemos. Em quase todas as sessões acontecem coisas muito marcantes pessoas que se emocionam muito e saem para recepção chorar, outras que ao termino da peça abraçam os recepcionistas e choram em seus braços. Outro fato muito interessante foi uma temporada que fizemos no teatro são João na cidade da Lapa-PR. este teatro foi no passado um deposito de armas e esconderijo de soldados de guerra muitos morreram exatamente onde é localizado o palco hoje, fizemos três apresentações neste lugar o publico e o elenco se emocionou muito durante a peça sentimos que muitos desencarnados tiveram bons esclarecimentos.
TE - A peça é destinada apenas ao público espírita?
RO - Não. A adaptação foi feita par reflexão sem nem uma pretensão de levar as pessoas a serem espíritas tive o cuidado de não interferir na forma como as pessoas vêem o outro lado da vida. Mais da metade do publico que tem assistido a peça não são espíritas e saem compreendendo a mensagem.
TE - Qual a mensagem que vocês procuram transmitir através da peça?
RO - É uma reflexão, fala sobre como as conseqüências de erros podem interferir no desenvolvimento espiritual de cada um, como as pessoas vêem a vida, e sobre a necessidade de mudá-la para melhor.
TE - Qual a reação do público após a apresentação?
RO - Saem impressionados ...é um silencio total.., alguns abraçam os recepcionistas do teatro e choram em seus braços agradecidos.
TE - Nestes mais de 2 anos de apresentações quais as maiores tristezas e alegrias?
RO - A maior alegria é ver este trabalho acontecendo a tanto tempo, o que é tão raro acontecer em nosso pais principalmente quando é um trabalho feito com recursos próprios sem nem um patrocínio, também a participação do elenco que independente do que vão ganhar, nunca deixou de estar presente como é o caso da atriz Regina Bastos que interpreta o papel da mãe de André Luiz, uma atriz de renome nacional que não mediu esforço, deixou proposta de trabalho muito importante para sua carreira, preferindo estar com a gente em Nosso Lar, sem mesmo ser espírita. Tristezas acho que não tenho muito a reclamar as vezes me entristece ver um projeto como este que pode auxiliar tanto na educação de nosso pais, tendo que ser executado por conta própria sem ter encontrado nem um patrocinador.
TE - Como você avalia a contribuição da arte dentro do movimento espírita?
RO - Acho de grande importância, mais acho mais importante o espiritismo na arte... palco é um trabalho que exige muita entrega, e nem sempre encontramos gente disposta no meio para encarar um trabalho que exige tanta entrega assim, também acho que falando de espiritualidade nos palcos independentes dos meios espíritas e com profissionais da área, não passamos aquela idéia de doutrinação, coisa que muitas pessoas odeiam, é comum a gente ouvir comentários de pessoas que vieram assistir a peça por que tiveram que trazer sua esposa ou vice-versa, e saíram daqui vendo o espiritismo com outros olhos. Acho que as produções de peças espíritas independentes, não tem o compromisso de doutrinar, temos apenas o compromisso de oferecer ao publico um bom trabalho no palco, assim existe uma entrega muito maior dos atores para o entendimento daquilo que estão representando, isso exige um estudo muito profundo para uma boa interpretação.
TE - Existem muitos grupos de teatro espírita, mas poucos conseguiram alcançar o grande público. Qual sua sugestão para que estes grupos alcancem o sucesso que vocês conseguiram?
RO - Bem acho que parte desta resposta esta na pergunta anterior pra completar eu digo aos que desejam ingressar neste projeto que tudo vem a seu tempo, primeiro a semente depois os frutos, os próprios textos espíritas ensinam isso, uma frase que gosto muito é quando Lísias diz a André Luiz é preciso reconhecer que toda a realização nobre exigem três coisas fundamentas primeiro é desejar, segundo saber desejar e o terceiro merecer.
TE - O grupo vai realizar apresentações em Fortaleza e Teresina. Qual a sua expectativa e o que o público pode esperar?
R.O - Estamos viabilizando todas as condições técnicas necessária para que o espetáculo não perca nada do que é apresentado em Curitiba, além de estarmos levando um dos maiores iluminadores do pais o Beto Bruel, estamos também oferecendo tanto em fortaleza como em Teresina uma oficina que vai preparar atores para participação na peça, isso vai valorizar muito as cenas que retratamos as trevas pretendemos colocar o maior numero possível de participante
TE - O que mudou na sua vida após a Doutrina Espírita?
RO - Uma grande mudança, hoje vejo o mundo com outros olhos. Encontrei mais segurança nas coisas que eu faço.
TE - Quais são os próximos projetos?
RO - ''Os mensageiros'' estreou já no festival de teatro de Curitiba realizando 4 apresentações, levaremos depois a cidade da Lapa PR. nos dias 15 e 16 de abril depois volta para Curitiba fazendo longa temporada. É um espetáculo lindo, não tem tanto impacto como Nosso Lar mais é um espetáculo que emociona muito, em seguida quero montar o terceiro livro da série André Luiz.
TE - Pediríamos que você deixasse uma mensagem para os nossos leitores
RO - Que procuremos entender melhor os acontecimentos da vida, não querendo mudar as pessoas de um dia para outro, pois a própria experiência de cada um se encarrega disso,o mais importante é vivenciar o mandamento maior que é ''amor ao próximo''
TE – Obrigado.
28 junho 2009
INTRODUÇÃO ANTROPOLÓGICA AO ESPIRITISMO
Um século após a codificação do Espiritismo por Allan Kardec, reina ainda grande incompreensão a respeito da doutrina, de sua própria natureza e de sua finalidade. A codificação, entretanto, foi elaborada em linguagem clara, precisa, sensível a todos. A lucidez natural do espírito francês, Kardec juntava a sua vocação e a sua experiência pedagógicas, além da compreensão de tratar com matéria sumamente complexa. Vemo-lo afirmar, a cada passo, que desejava escrever de maneira a não deixar margem para interpretações, ou seja, para divergências interpretativas.
Qual o motivo, então, por que os próprios adeptos do Espiritismo, ainda hoje, divergem, no tocante a questões doutrinárias de importância? E qual o motivo por que os não-espíritas continuam a tratar o Espiritismo com a maior incompreensão? Note-se que não nos referimos a adversários, pois estes têm a sua razão, mas aos não-espíritas. Parece-nos que a explicação, para os dois casos, é a mesmo. O Espiritismo é uma doutrina do futuro. À maneira do Cristianismo, abre caminho no mundo, enfrentando a incompreensão de adeptos e não-adeptos. Em primeiro lugar, há o problema da posição da doutrina. Uns a encaram como sistematização de velhas superstições; outros, como tentativa frustrada de elaboração científica; outros, como ciência infusa, não organizada; outros ainda, como esboço impreciso de filosofia religiosa; outros como mais uma seita, entre as muitas seitas religiosas do mundo. Para a maioria de adeptos e não-adeptos, o Espiritismo se apresenta como simples crença, espécie de religião e superstição, ao mesmo tempo, eivada de resíduos mágicos.
Ao contrário de tudo isso, porém, o Espiritismo, segundo a definição de Kardec e dos seus principais continuadores, constitui a última fase do processo do conhecimento. Última, não no sentido de fase final, mas da que o homem pôde atingir até agora, na sua lenta evolução através do tempo. É evidente que se trata do conhecimento em sentido geral, não limitado a um determinado aspecto, não especializado. Nesse sentido geral, o Espiritismo aparece como uma síntese dos esforços humanos para compreensão do mundo e da vida. Justifica-se assim, que haja dificuldade para sua compreensão, apesar da clareza da estrutura doutrinária da codificação. De um lado, o povo não pode abarcá-lo na sua totalidade, contentando-se com seu aspecto religioso; de outro, os especialistas, não admitem a sua natureza sintética; e de outro, ainda, os preconceitos culturais levantam numerosas objeções aos seus princípios.
No capítulo primeiro de A Gênese, número 18, Kardec explica que o Espiritismo, do ponto de vista científico, tem por objeto um dos dois elementos constitutivos do universo, que é o espírito. O outro elemento é a matéria. Como ambos se entrelaçam, para a constituição do todo universal, o Espiritismo "toca forçosamente na maioria das ciências", ou seja, está necessariamente ligado ao desenvolvimento das ciências. Assim sendo, esclarece o codificador: "Ele não poderia aparecer senão depois da elaboração delas, e surgiu por força das coisas, da impossibilidade de tudo explicar-se somente com a ajuda das leis da matéria."
Léon Denis, sucessor e continuador de Kardec, observa em seu livro Le Genie Celtique e Le Monde Invisible, o seguinte: "Pode dizer-se que a obra do Espiritismo é dupla: no plano terreno ela tende a reunir e a fundir, numa síntese grandiosa, todas as formas, até aqui dispersas e muitas vezes contraditórias, do pensamento e a da ciência. Num plano mais amplo, une o visível e o invisível, essas duas formas da vida, que, na realidade, se interpenetram e se completam, desde o princípio das coisas". Logo a seguir, como prevenindo a objeção de dualismo que se poderia fazer, Denis acentua: "No seu desenvolvimento, ele demonstra que o nosso mundo e o Lado-de-Lá não estão separados, mas entrosados um no outro, constituindo assim um todo harmônico".
Os estudantes de Espiritismo sabem que muitos outros trechos, tanto de Kardec quanto dos seus seguidores, podem ser citados, para afirmar a tese da natureza sintética da doutrina, bem como a sua posição de última fase do processo do conhecimento. Lembramos particularmente a definição da doutrina em O que é o Espiritismo, de Kardec, sobre a qual voltaremos mais tarde.
Basta-nos, no momento, esta colocação do problema, para justificar a nossa tentativa de oferecer uma visão histórica do desenvolvimento espiritual do homem, como a forma mais apropriada de introdução ao estudo da doutrina.
Foi o próprio Kardec quem criou a disciplina que procuramos desenvolver neste curso, tanto com a "Introdução ao estudo da doutrina espírita" que abre O Livro dos Espíritos, quanto com o Principiante Espírita. O nosso curso não dispensa, antes requer o estudo desses trabalhos do codificador. Mas é evidente que a introdução a qualquer ramo do conhecimento, como explica o filósofo Julián Marias , no caso particular da "Introdução à Filosofia", exige sempre novas perspectivas, de acordo com o fluir do tempo. A introdução, diz Marias, é o agora, o circunstancial, o ato de introduzir alguém em alguma coisa. Essa alguma coisa seja a Filosofia ou seja, o Espiritismo, é uma realidade histórica uma coisa que existe de maneira concreta.
Sendo o Espiritismo uma realidade histórica, afinada pelo codificador e seus sucessores, tem ele o seu passado e o seu presente, como terá o seu futuro. No tempo de Kardec, introduzir alguém no estudo do Espiritismo era introduzi-lo numa realidade nascente, numa verdadeira problemática em ebulição, num processo histórico em princípio de definição, e principalmente "numa nova ordem de idéias". Hoje, é introduzir esse alguém num processo já definido, e não apenas numa ordem de idéias, mas também no quadro histórico, em que essa ordem surgiu. Dessa maneira, é introduzi-la também na própria introdução de Kardec. Esse o motivo por que escrevemos, para a nossa tradução de O Livro dos Espíritos, editado pela FEESP uma introdução à obra.
Sem o exame histórico do problema mediúnico, por exemplo, os estudantes de hoje estarão ameaçados de flutuar no abstrato. Introduzindo-se numa ordem de idéias, sem o conhecimento de suas raízes históricas, arriscam-se a confundir, como fazem os leigos, mediunismo e Espiritismo, ou seja, o processo mediúnico de desenvolvimento espiritual do homem, com o Espiritismo. Arriscam-se, ainda mais, a aturdir-se com fatos mediúnicos rudimentares, considerando-os, por sua aparência extravagante, como novidades. Por outro lado, dificilmente compreenderão a aparente contradição existente no fato de ser o Espiritismo, ao mesmo tempo, uma doutrina moderna e um processo histórico provindo das eras mais remotas da humanidades. Existe ainda o problema religioso, e particularmente o das ligações do Espiritismo com o Cristianismo, que somente uma introdução histórica pode esclarecer.
Por tudo isso, foi que nos propusemos a dar este curso, à convite da União da Mocidade Espírita de S. Paulo - a partir do "horizonte primitivo", ou seja, das manifestações mediúnicas entre os homens primitivos, examinando as fases históricas que nos conduziram até ao momento presente. Para isso, servimo-nos da bibliografia doutrinária, como fundamental, e de outros livros, de reconhecido valor cultural, como subsidiários. Daremos a indicação bibliográfica, para facilitar aos interessados maior aprofundamento do assunto.
J. Herculano Pires - O Espírito e o Tempo
Qual o motivo, então, por que os próprios adeptos do Espiritismo, ainda hoje, divergem, no tocante a questões doutrinárias de importância? E qual o motivo por que os não-espíritas continuam a tratar o Espiritismo com a maior incompreensão? Note-se que não nos referimos a adversários, pois estes têm a sua razão, mas aos não-espíritas. Parece-nos que a explicação, para os dois casos, é a mesmo. O Espiritismo é uma doutrina do futuro. À maneira do Cristianismo, abre caminho no mundo, enfrentando a incompreensão de adeptos e não-adeptos. Em primeiro lugar, há o problema da posição da doutrina. Uns a encaram como sistematização de velhas superstições; outros, como tentativa frustrada de elaboração científica; outros, como ciência infusa, não organizada; outros ainda, como esboço impreciso de filosofia religiosa; outros como mais uma seita, entre as muitas seitas religiosas do mundo. Para a maioria de adeptos e não-adeptos, o Espiritismo se apresenta como simples crença, espécie de religião e superstição, ao mesmo tempo, eivada de resíduos mágicos.
Ao contrário de tudo isso, porém, o Espiritismo, segundo a definição de Kardec e dos seus principais continuadores, constitui a última fase do processo do conhecimento. Última, não no sentido de fase final, mas da que o homem pôde atingir até agora, na sua lenta evolução através do tempo. É evidente que se trata do conhecimento em sentido geral, não limitado a um determinado aspecto, não especializado. Nesse sentido geral, o Espiritismo aparece como uma síntese dos esforços humanos para compreensão do mundo e da vida. Justifica-se assim, que haja dificuldade para sua compreensão, apesar da clareza da estrutura doutrinária da codificação. De um lado, o povo não pode abarcá-lo na sua totalidade, contentando-se com seu aspecto religioso; de outro, os especialistas, não admitem a sua natureza sintética; e de outro, ainda, os preconceitos culturais levantam numerosas objeções aos seus princípios.
No capítulo primeiro de A Gênese, número 18, Kardec explica que o Espiritismo, do ponto de vista científico, tem por objeto um dos dois elementos constitutivos do universo, que é o espírito. O outro elemento é a matéria. Como ambos se entrelaçam, para a constituição do todo universal, o Espiritismo "toca forçosamente na maioria das ciências", ou seja, está necessariamente ligado ao desenvolvimento das ciências. Assim sendo, esclarece o codificador: "Ele não poderia aparecer senão depois da elaboração delas, e surgiu por força das coisas, da impossibilidade de tudo explicar-se somente com a ajuda das leis da matéria."
Léon Denis, sucessor e continuador de Kardec, observa em seu livro Le Genie Celtique e Le Monde Invisible, o seguinte: "Pode dizer-se que a obra do Espiritismo é dupla: no plano terreno ela tende a reunir e a fundir, numa síntese grandiosa, todas as formas, até aqui dispersas e muitas vezes contraditórias, do pensamento e a da ciência. Num plano mais amplo, une o visível e o invisível, essas duas formas da vida, que, na realidade, se interpenetram e se completam, desde o princípio das coisas". Logo a seguir, como prevenindo a objeção de dualismo que se poderia fazer, Denis acentua: "No seu desenvolvimento, ele demonstra que o nosso mundo e o Lado-de-Lá não estão separados, mas entrosados um no outro, constituindo assim um todo harmônico".
Os estudantes de Espiritismo sabem que muitos outros trechos, tanto de Kardec quanto dos seus seguidores, podem ser citados, para afirmar a tese da natureza sintética da doutrina, bem como a sua posição de última fase do processo do conhecimento. Lembramos particularmente a definição da doutrina em O que é o Espiritismo, de Kardec, sobre a qual voltaremos mais tarde.
Basta-nos, no momento, esta colocação do problema, para justificar a nossa tentativa de oferecer uma visão histórica do desenvolvimento espiritual do homem, como a forma mais apropriada de introdução ao estudo da doutrina.
Foi o próprio Kardec quem criou a disciplina que procuramos desenvolver neste curso, tanto com a "Introdução ao estudo da doutrina espírita" que abre O Livro dos Espíritos, quanto com o Principiante Espírita. O nosso curso não dispensa, antes requer o estudo desses trabalhos do codificador. Mas é evidente que a introdução a qualquer ramo do conhecimento, como explica o filósofo Julián Marias , no caso particular da "Introdução à Filosofia", exige sempre novas perspectivas, de acordo com o fluir do tempo. A introdução, diz Marias, é o agora, o circunstancial, o ato de introduzir alguém em alguma coisa. Essa alguma coisa seja a Filosofia ou seja, o Espiritismo, é uma realidade histórica uma coisa que existe de maneira concreta.
Sendo o Espiritismo uma realidade histórica, afinada pelo codificador e seus sucessores, tem ele o seu passado e o seu presente, como terá o seu futuro. No tempo de Kardec, introduzir alguém no estudo do Espiritismo era introduzi-lo numa realidade nascente, numa verdadeira problemática em ebulição, num processo histórico em princípio de definição, e principalmente "numa nova ordem de idéias". Hoje, é introduzir esse alguém num processo já definido, e não apenas numa ordem de idéias, mas também no quadro histórico, em que essa ordem surgiu. Dessa maneira, é introduzi-la também na própria introdução de Kardec. Esse o motivo por que escrevemos, para a nossa tradução de O Livro dos Espíritos, editado pela FEESP uma introdução à obra.
Sem o exame histórico do problema mediúnico, por exemplo, os estudantes de hoje estarão ameaçados de flutuar no abstrato. Introduzindo-se numa ordem de idéias, sem o conhecimento de suas raízes históricas, arriscam-se a confundir, como fazem os leigos, mediunismo e Espiritismo, ou seja, o processo mediúnico de desenvolvimento espiritual do homem, com o Espiritismo. Arriscam-se, ainda mais, a aturdir-se com fatos mediúnicos rudimentares, considerando-os, por sua aparência extravagante, como novidades. Por outro lado, dificilmente compreenderão a aparente contradição existente no fato de ser o Espiritismo, ao mesmo tempo, uma doutrina moderna e um processo histórico provindo das eras mais remotas da humanidades. Existe ainda o problema religioso, e particularmente o das ligações do Espiritismo com o Cristianismo, que somente uma introdução histórica pode esclarecer.
Por tudo isso, foi que nos propusemos a dar este curso, à convite da União da Mocidade Espírita de S. Paulo - a partir do "horizonte primitivo", ou seja, das manifestações mediúnicas entre os homens primitivos, examinando as fases históricas que nos conduziram até ao momento presente. Para isso, servimo-nos da bibliografia doutrinária, como fundamental, e de outros livros, de reconhecido valor cultural, como subsidiários. Daremos a indicação bibliográfica, para facilitar aos interessados maior aprofundamento do assunto.
J. Herculano Pires - O Espírito e o Tempo
26 junho 2009
PESQUISA CIENTÍFICA DA MEDIUNIDADE
SESSÕES EXPERIMENTAIS
A pesquisa científica dos fenômenos mediúnicos foi iniciada e desenvolvida por Allan Kardec na parte psicológica. Embora os fenômenos físicos despertem maior interesse em todo o mundo, Kardec dedicou maior atenção aos fenômenos psicológicos, partindo de um critério metodológico justificado pela sua posição filosófica. Formado e especializado em Pedagogia, na Escola de Pestalozzi, interessava-se profundamente pelos problemas da natureza humana. Assim como o Magnetismo, em voga na época, abrira-lhe novas perspectivas para investigação das potencialidades anímicas do homem, os fenômenos mediúnicos revelavam-lhe novas possibilidades nesse sentido. Considerou os fenômenos físicos como simples efeito de uma causa que era naturalmennte mais importante. Em 1854, quando observou pela primeira vez os fenômenos mediúnicos de natureza física (movimentos de objetos, dança das mesas, etc.) considerou-os como de origem possivelmente energética, produzidos por indução de correntes elétricas das pessoas presentes ou efeitos desconhecidos da lei da gravidade. Logo mais estabeleceu relações entre o psiquismo dos médiuns e essas forças, antecipando de vinte anos a Psicologia-Fisiológica de Wilhem Wundt, que surgiria em 1874. Experiências posteriores com as meninas Julia e Carolina Baudin e com a Srta. Japhet lhe provaram a presença de inteligências estranhas na produção e orientação dos fenômenos. Kardec reconheceu a importância desse fato e desenvolveu métodos específicos de pesquisa, relacionando os fatos espirituais com os psíquicos ( psiquismo dos médiuns) e anímicos (alma dos médiuns) e fisiológicos. Esse complexo de fatores antecipava a metodologia de Wundt e superava antecipadamente a metodologia experimental de Weber e Fechner.
Das experiências iniciais com médiuns diversos, em que obteve o material reunido em O Livro dos Espíritos passou aos trabalhos sistemáticos da Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas, onde contava com a colaboração de Camille Flamarion, Alexandre e Gabriel Delane, Victorien Sardou, Didier e outros. Recusou-se a fazer pesquisas físicas, deixando estas a cargo dos especialistas científicos que punham em dúvida a validade dos seus trabalhos. Sua convicção o levava a não desviar-se do rumo traçado e a lançar esse desafio aos adversários e críticos. A tenacidade e o rigor com que prosseguiu nas pesquisas, que qualificou justamente de psicológicas, e os resultados a que chegou, positivos e irrefutáveis, teriam lhe assegurado a posição de iniciador da Psicologia Experimental que deram a Wundt, e a de pioneiro da Psicologia Profunda, que deram a Freud. Ao tratar das manifestações anímicas dos médiuns revelou existência do inconsciente, sua dinâmica e a influência no comportamento humano, e isso quando Sigmund Freud não tinha mais do que um ano de idade. A catarse espírita de Kardec foi muito mais eficaz e profunda que a catarse psicanalítica de hoje. Albert de Rochas o provou na França e Wladimir Raikov, seguindo o método empregado por De Rochas, o comprova hoje na Universidade de Moscou, enquanto Ian Stevenson faz o mesmo na Universidade da Califórnia (EUA) embora sem o gênio e o rigor Kardecianos. O preconceito científico (aberração nas ciências) e a alienação cultural do materialismo, que colocou um pressuposto absurdo como base de toda a Ciência, negaram a Kardec o reconhecimento de sua contribuição ao desenvolvimento da Cultura.
O desafio aos sábios, entretanto, surtia os seus efeitos. As pesquisas de William Croockes, Henry Sidgurick, Edmund Gumey, Oliver Lodge, Frederic Myers, Schrenk Notzing, Charles Richet, Gustave Geley, Eugene Osty, Fredrich Zollner, Paul Gibier e tantos outros nomes exponenciais da Ciência comprovaram, nos anos sucessivos, a validade absoluta do trabalho pioneiríssimo de Kardec. Hoje a Parapsicologia e a própria Física, que rompeu o seu arcabouço de materialismo estratificado, mostraram, sem querer e sem saber, que as conclusões Kardecianas são verdadeiras. Incumbiram-se os parapsicólogos e os físicos atuais da reparação científica devida inexoravelmente a Kardec.
Muitas pessoas reclamam da falta de pesquisas científicas dos fenômenos espíritas na atualidade, sem perceber que essas pesquisas prosseguem como deveriam e como Kardec desejava, ou seja, nos laboratórios científicos de todos os grandes centro universitários do mundo, pela "força das coisas", como escrevia Kardec, por necessidade absoluta do progresso científico e sem qualquer delimitação ideológica e sectária. E enquanto os cientistas cumprem o seu dever de pesquisar sem preconceitos, os espíritas prosseguem na prática de suas atividades doutrinárias, socorrendo as vítimas do equívoco cientifico (os obsedados, fascinados e subjugados) através de suas simples e humildes sessões de assistência fraterna e gratuita. Isso não impede que os espíritas, no âmbito de suas instituições doutrinárias, realizem também suas sessões de pesquisas científicas. Mas as instituições espíritas em geral, não dispõem de condições para esse trabalho especializado (diremos mesmo: especializadíssimo) que exige a participação de especialistas, de aparelhagem custosa, de todos os recursos de um laboratório de tipo universitário.
Algumas instituições espíritas aventuram-se ingenuamente à promoção de pesquisas sem disporem de nada disso. Alimentam ainda as crendices religiosas do passado, esperando que o Alto (o mundos dos espíritos superiores) possa suprir as suas desoladoras deficiências culturais e conceptuais, no tocante ao problema espírita. Alguns graduados universitários, pensam que seus canudos de bacharel ou licenciado são suficientes para lhe dar a habilitação especializada que não possuem. Criam institutos científicos domésticos, sem recursos de espécie alguma para pesquisas complexas e refinadas, e passam a julgar-se e apresentar-se, até mesmo em televisões, como cientistas dignos de acato. Um pouco de bom-senso bastaria para lhes mostrar o erro em que incidem. Enquanto não tivermos uma Universidade suficientemente aparelhada - em pessoal especializado e competente e com a aparelhagem técnica suficiente - não podemos promover sessões de materialização, efeitos físicos, ectoplasmia diversificada, psicofonia e escrita direta, que possam dar algum resultado positivo no campo dos interesses científicos. O exemplo de Kardec deve servir de advertência aos que se aventuram nesse terreno escorregadio.
Vivendo num tempo em que o problema cientifico era muito menos complexo do que hoje, assim mesmo ele se recusou a dedicar-se a trabalhos que poderiam desviá-lo do campo exigente da elaboração e divulgação da Doutrina Espírita, que precisava levar o seu socorro imediato ao povo, preparando a mente popular a superação indispensável das concepções supersticiosas do passado. A tarefa principal de um espírita consciente, naquele tempo, como ainda hoje, era a de assentar as bases do novo edifício a construir. Os meios científicos atuais já chegaram à compreensão de que os tabus materialistas foram pulverizados pelas explosões atômicas. A realidade espiritual se impõe de tal maneira que os materialistas são obrigados a sofismar e até mesmo a disfarçar suas conquistas científicas mais avançadas, para não darem a mão a palmatória implacável da Verdade. A História, a Filosofia, a Psicologia a Antropologia, a Física, a Astronáutica - todas as Ciências, enfim - já atravessaram o limiar do Mundo Espiritual e não podem mais recuar. Já temos a pesquisa da reencarnação, dos fenômenos paranormais, especialmente dos chamados "fenômenos théta" (de manifestações e comunicações de espíritos) nos mais adiantados centros universitários do mundo, sem excluir sequer os da órbita soviética, onde o "corpo-bioplásmico" é o novo fantasma, agora constituído de plasma físico, que apavora os remanescentes do Materialismo falecido por asfixia e reduzido a cinzas nos fornos crematórios da Verdade. Pensemos nisso, analisemos bem esses problemas, antes de nos aventurarmos a pioneiros de porão, na retaguarda do avanço científico e tecnológico dos nossos dias, que não estamos em condições de acompanhar.
J. Herculano Pires
A pesquisa científica dos fenômenos mediúnicos foi iniciada e desenvolvida por Allan Kardec na parte psicológica. Embora os fenômenos físicos despertem maior interesse em todo o mundo, Kardec dedicou maior atenção aos fenômenos psicológicos, partindo de um critério metodológico justificado pela sua posição filosófica. Formado e especializado em Pedagogia, na Escola de Pestalozzi, interessava-se profundamente pelos problemas da natureza humana. Assim como o Magnetismo, em voga na época, abrira-lhe novas perspectivas para investigação das potencialidades anímicas do homem, os fenômenos mediúnicos revelavam-lhe novas possibilidades nesse sentido. Considerou os fenômenos físicos como simples efeito de uma causa que era naturalmennte mais importante. Em 1854, quando observou pela primeira vez os fenômenos mediúnicos de natureza física (movimentos de objetos, dança das mesas, etc.) considerou-os como de origem possivelmente energética, produzidos por indução de correntes elétricas das pessoas presentes ou efeitos desconhecidos da lei da gravidade. Logo mais estabeleceu relações entre o psiquismo dos médiuns e essas forças, antecipando de vinte anos a Psicologia-Fisiológica de Wilhem Wundt, que surgiria em 1874. Experiências posteriores com as meninas Julia e Carolina Baudin e com a Srta. Japhet lhe provaram a presença de inteligências estranhas na produção e orientação dos fenômenos. Kardec reconheceu a importância desse fato e desenvolveu métodos específicos de pesquisa, relacionando os fatos espirituais com os psíquicos ( psiquismo dos médiuns) e anímicos (alma dos médiuns) e fisiológicos. Esse complexo de fatores antecipava a metodologia de Wundt e superava antecipadamente a metodologia experimental de Weber e Fechner.
Das experiências iniciais com médiuns diversos, em que obteve o material reunido em O Livro dos Espíritos passou aos trabalhos sistemáticos da Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas, onde contava com a colaboração de Camille Flamarion, Alexandre e Gabriel Delane, Victorien Sardou, Didier e outros. Recusou-se a fazer pesquisas físicas, deixando estas a cargo dos especialistas científicos que punham em dúvida a validade dos seus trabalhos. Sua convicção o levava a não desviar-se do rumo traçado e a lançar esse desafio aos adversários e críticos. A tenacidade e o rigor com que prosseguiu nas pesquisas, que qualificou justamente de psicológicas, e os resultados a que chegou, positivos e irrefutáveis, teriam lhe assegurado a posição de iniciador da Psicologia Experimental que deram a Wundt, e a de pioneiro da Psicologia Profunda, que deram a Freud. Ao tratar das manifestações anímicas dos médiuns revelou existência do inconsciente, sua dinâmica e a influência no comportamento humano, e isso quando Sigmund Freud não tinha mais do que um ano de idade. A catarse espírita de Kardec foi muito mais eficaz e profunda que a catarse psicanalítica de hoje. Albert de Rochas o provou na França e Wladimir Raikov, seguindo o método empregado por De Rochas, o comprova hoje na Universidade de Moscou, enquanto Ian Stevenson faz o mesmo na Universidade da Califórnia (EUA) embora sem o gênio e o rigor Kardecianos. O preconceito científico (aberração nas ciências) e a alienação cultural do materialismo, que colocou um pressuposto absurdo como base de toda a Ciência, negaram a Kardec o reconhecimento de sua contribuição ao desenvolvimento da Cultura.
O desafio aos sábios, entretanto, surtia os seus efeitos. As pesquisas de William Croockes, Henry Sidgurick, Edmund Gumey, Oliver Lodge, Frederic Myers, Schrenk Notzing, Charles Richet, Gustave Geley, Eugene Osty, Fredrich Zollner, Paul Gibier e tantos outros nomes exponenciais da Ciência comprovaram, nos anos sucessivos, a validade absoluta do trabalho pioneiríssimo de Kardec. Hoje a Parapsicologia e a própria Física, que rompeu o seu arcabouço de materialismo estratificado, mostraram, sem querer e sem saber, que as conclusões Kardecianas são verdadeiras. Incumbiram-se os parapsicólogos e os físicos atuais da reparação científica devida inexoravelmente a Kardec.
Muitas pessoas reclamam da falta de pesquisas científicas dos fenômenos espíritas na atualidade, sem perceber que essas pesquisas prosseguem como deveriam e como Kardec desejava, ou seja, nos laboratórios científicos de todos os grandes centro universitários do mundo, pela "força das coisas", como escrevia Kardec, por necessidade absoluta do progresso científico e sem qualquer delimitação ideológica e sectária. E enquanto os cientistas cumprem o seu dever de pesquisar sem preconceitos, os espíritas prosseguem na prática de suas atividades doutrinárias, socorrendo as vítimas do equívoco cientifico (os obsedados, fascinados e subjugados) através de suas simples e humildes sessões de assistência fraterna e gratuita. Isso não impede que os espíritas, no âmbito de suas instituições doutrinárias, realizem também suas sessões de pesquisas científicas. Mas as instituições espíritas em geral, não dispõem de condições para esse trabalho especializado (diremos mesmo: especializadíssimo) que exige a participação de especialistas, de aparelhagem custosa, de todos os recursos de um laboratório de tipo universitário.
Algumas instituições espíritas aventuram-se ingenuamente à promoção de pesquisas sem disporem de nada disso. Alimentam ainda as crendices religiosas do passado, esperando que o Alto (o mundos dos espíritos superiores) possa suprir as suas desoladoras deficiências culturais e conceptuais, no tocante ao problema espírita. Alguns graduados universitários, pensam que seus canudos de bacharel ou licenciado são suficientes para lhe dar a habilitação especializada que não possuem. Criam institutos científicos domésticos, sem recursos de espécie alguma para pesquisas complexas e refinadas, e passam a julgar-se e apresentar-se, até mesmo em televisões, como cientistas dignos de acato. Um pouco de bom-senso bastaria para lhes mostrar o erro em que incidem. Enquanto não tivermos uma Universidade suficientemente aparelhada - em pessoal especializado e competente e com a aparelhagem técnica suficiente - não podemos promover sessões de materialização, efeitos físicos, ectoplasmia diversificada, psicofonia e escrita direta, que possam dar algum resultado positivo no campo dos interesses científicos. O exemplo de Kardec deve servir de advertência aos que se aventuram nesse terreno escorregadio.
Vivendo num tempo em que o problema cientifico era muito menos complexo do que hoje, assim mesmo ele se recusou a dedicar-se a trabalhos que poderiam desviá-lo do campo exigente da elaboração e divulgação da Doutrina Espírita, que precisava levar o seu socorro imediato ao povo, preparando a mente popular a superação indispensável das concepções supersticiosas do passado. A tarefa principal de um espírita consciente, naquele tempo, como ainda hoje, era a de assentar as bases do novo edifício a construir. Os meios científicos atuais já chegaram à compreensão de que os tabus materialistas foram pulverizados pelas explosões atômicas. A realidade espiritual se impõe de tal maneira que os materialistas são obrigados a sofismar e até mesmo a disfarçar suas conquistas científicas mais avançadas, para não darem a mão a palmatória implacável da Verdade. A História, a Filosofia, a Psicologia a Antropologia, a Física, a Astronáutica - todas as Ciências, enfim - já atravessaram o limiar do Mundo Espiritual e não podem mais recuar. Já temos a pesquisa da reencarnação, dos fenômenos paranormais, especialmente dos chamados "fenômenos théta" (de manifestações e comunicações de espíritos) nos mais adiantados centros universitários do mundo, sem excluir sequer os da órbita soviética, onde o "corpo-bioplásmico" é o novo fantasma, agora constituído de plasma físico, que apavora os remanescentes do Materialismo falecido por asfixia e reduzido a cinzas nos fornos crematórios da Verdade. Pensemos nisso, analisemos bem esses problemas, antes de nos aventurarmos a pioneiros de porão, na retaguarda do avanço científico e tecnológico dos nossos dias, que não estamos em condições de acompanhar.
J. Herculano Pires
FRAGMENTAÇÃO DA IGREJA
A partir da rebelião luterana, os arcabouços religiosos medievais cederam ao impacto do espírito renovador. A Igreja fragmentou-se. Rompidos os arcabouços, o edifício gigantesco ameaçou ruir. Aquilo que Erasmo temia, verificou-se de maneira inapelável. Durante séculos, o mundo não gozaria mais da unidade religiosa, e consequentemente, da "pax romana" da Idade Média. A timidez de Erasmo, os seus excessos de prudência, não lhe haviam deixado perceber o sentido profundo das próprias palavras evangélicas, atribuídas ao Cristo: "Não julgueis que vim trazer paz à terra; não vim trazer-lhe a paz, mas a espada". (Mateus, X: 34.) Ou ainda: "Eu vim trazer fogo à Terra, e que mais quero, senão que ele se acenda?"( Lucas, XII49).
A mesma espada que dividiu os judeus na era apostólica, a partir da pregação do Cristo, o mesmo fogo que lavrou no seio do Judaísmo, devastando a sua unidade apática, haviam também de dividir os cristãos e calcinar o dogmatismo fideísta da nova estagnação religiosa. A "religião estática" cederia lugar aos impulsos revitalizadores da "religião dinâmica", desse "élan vital" que teria de romper as estruturas materiais, para que a "religião em espírito e verdade" pudesse triunfar dos formalismos dominantes. Lutero sentia profundamente essa verdade, embora ainda não pudesse compreendê-la em plenitude. Erasmo a compreendeu, mas não a sentiu com a intensidade suficiente para impulsioná-lo à ação. Esse desajuste, entretanto, era necessário ao desenvolvimento do processo histórico, que não poderia prescindir das fases que caracterizam o desenrolar da história. A revolução luterana consolidou-se com o código de vinte e oito artigos da Confissão de Augsburg, elaborado por Melanchton, e expandiu-se rapidamente pela Alemanha e os países nórdicos, tornando-se religião estatal. Lutero pretendia substituir os símbolos medievais pela verdade evangélica, substituir o aparelhamento do culto pela presença do Cristo. Era um impulso decisivo de volta às origens cristãs. Mas as próprias circunstâncias apresentavam obstáculos diversos a esse retorno ideal. O luteranismo não conseguiu abolir completamente a simbólica religiosa do catolicismo-romano e terminou adaptando uma parte da mesma. Conservou os três sacramentos que considerava fundamentais: o batismo, a comunhão e a penitência, e manteve a organização sacerdotal. Mas o mais curioso da Reforma foi à substituição de uma idolatria por outra. Em lugar dos ídolos, das relíquias, do instrumental variado do culto, do dogmatismo dos concílios e da autoridade papal, o luteranismo consagrou a idolatria da letra, a infalibilidade dos textos sagrados.
Paulo, o apóstolo, já havia ensinado que a letra mata e somente o espírito vivifica. Mas também a liberdade subitamente conquistada pode matar. Livrando-se do peso morto dos ídolos materiais que atravancam a religião medieval, os reformadores da Renascença deviam apegar-se forçosamente a alguma coisa. Essa nova base, sobre a qual deviam firmar-se para prosseguir na luta, foi a "Palavra de Deus", consubstanciada nos textos da Escritura. A Reforma estabeleceu o império do literalismo, o domínio da letra. Jamais o Cristianismo europeu fizera tanto jus à denominação da "religião do livro", que os maometanos lhe haviam dado. Nos templos reformados, a Bíblia substituiu a imagem. É fácil compreendermos que um grande passo estava dado, pois libertar a letra era a medida indispensável para conseguir-se a libertação do espírito, nela encerrado.
O "verdadeiro evangelho", de que Erasmo falara a Frederico da Saxônia, surgiu sobre a Europa nas múltiplas traduções para as línguas nacionais, a partir da germânica. Os textos ocultos, até então privilégio dos clérigos eram retirados das criptas e oferecidos ao povo, que os recebia com sofreguidão. A possibilidade de contato direto com a Escritura, o direito de sentir o seu poder inspirador nos próprios textos, sem as interpretações clericais, eis a novidade que abalava o Cristianismo e abria perspectivas imprevisíveis para o seu desenvolvimento. Foi essa a missão espiritual da Reforma. Sem o florescimento da seara cristã, sem essa floração magnífica do Evangelho, por toda parte, não poderiam chegar ao tempo dos frutos e da colheita, que viria mais tarde, quando se cumprisse a Promessa do Consolador.
Na França e na Suíça, Zwinglio e Calvino se incumbiram de dar prosseguimento à Reforma, que se estendeu rapidamente aos Países Baixos e à Escócia. Calvino parece ter sentido ainda, mais fundamento que Lutero, a necessidade de libertar o Cristianismo da asfixia dos símbolos. Apegou-se, entretanto, ao dogma da predestinação, e seu fanatismo atingiu às raias da brutalidade, com terríveis episódios de violência. Não obstante, sua contribuição resultou no vigoroso surto do liberalismo protestante, iluminado pela influência do criticismo kantiano. Na Inglaterra, a libertação do domínio papal, efetuada por Henrique VIII e consolidada pela rainha Elisabete, não chegou a atingir a profundidade das reformas de Lutero e Calvino. A igreja Anglicana, dominada pelo soberano nacional, conservou enorme acervo da herança medieval.
De qualquer maneira, a reforma estendeu-se por toda parte, deitou raízes na América, e obrigou a Igreja a também se reformar, através do Concílio de Trento, em suas três sessões sucessivas. O movimento da Contra-Reforma apresentou duas faces contraditórias: uma negativa, com a instituição do Santo Ofício, o estabelecimento da Inquisição; outra positiva, com o trabalho educacional da Companhia de Jesus. A primeira face correspondia à indignação do fanatismo ferido; a Segunda, à compreensão da inteligência eclesiástica, alertada pela prudência de Erasmo, de que novos tempos haviam surgido e novas aspirações sacudiam vigorosamente os povos. A impetuosidade de Lutero produzira os resultados necessários. O fogo ateado pelo Cristo se reacendera nos corações, até então amortalhados pela rotina secular. Uma nova terra e um novo céu começavam a aparecer, segundo a previsão apocalíptica. E a partir do século dezoito, o clima estava preparado para o segundo grande passo do Cristianismo, que seria dado com a superação do literalismo; a libertação do espírito. Caberia a Kardec, a serviço do Consolador, libertar da letra que mata o espírito que vivifica.
RUPTURA DO ARCABOUÇO LITERAL
A posição do Espiritismo, em face dos textos sagrados do Cristianismo, parece ambígua. Ao mesmo tempo em que se apóia nos textos, a doutrina, a partir de Kardec, e por seus mais autorizados divulgadores, também os critica. Nada mais coerente com a natureza declaradamente racional do Espiritismo, com a sua orientação analítica, e portanto científica. A ambigüidade apontada pelos opositores não é mais do que o uso da liberdade de exame, sem o qual o Espiritismo teria de submeter-se ao dogmatismo literalista, incapaz de libertar, da prisão da letra, o espírito que vivifica. Admitir o absolutismo das Escrituras seria frustrar a evolução do Cristianismo, nos rumos da plena espiritualidade, que constitui ao mesmo tempo a sua essência e o seu destino, o seu objetivo.
O Cristianismo Primitivo aprendera a libertar das escrituras judaicas o seu conteúdo espiritual, como vemos nas epístolas apostólicas e nos próprios textos evangélicos. Estes textos, por sua vez, apresentam-se na forma livre de anotações, testemunhando a liberdade espiritual do ensino do Cristo, que não se prendia a nenhum esquema literal dotado de rigidez. Não obstante, o cristianismo medieval construiu um rígido arcabouço literal, no qual prendeu e abafou, sob os demais arcabouços da imensa construção da Igreja, a essência dos ensinos cristãos, o seu livre espírito. A Reforma, rompendo os arcabouços da superestrutura, não teve forças para romper o da infra-estrutura, por entender que neste se encontrava a base do Cristianismo. Romper o arcabouço literal seria como destruir os alicerces do edifício.
Era natural que assim acontecesse, pois os reformadores do Renascimento não poderiam ir até as últimas conseqüências. Primeiro, porque a sua ação estava naturalmente limitada pelas possibilidades da época; e depois, porque ela se destinava a preparar condições para o novo impulso a ser dado. Somente o reconhecimento das manifestações espíritas, o estudo desses fenômenos e a aceitação racional das comunicações esclarecedoras, dadas por via mediúnica, poderiam levar ao rompimento do arcabouço literal, última forma concreta em que o espírito cristão se refugiava. Podemos compreender o apego dos literalistas à "Palavra de Deus", quando nos lembramos dessa lei de inércia que nos amarra aos velhos hábitos. Melhor ainda o compreendemos, ao pensar na sensação de insegurança que devem ter sentido os reformistas, na proporção em que demoliam os arcabouços do velho e poderoso edifício, no qual por tantos séculos se abrigara a fé de seus antepassados e a deles mesmos.
O Cristo ensinara, com absoluta clareza, segundo as anotações evangélicas, que precisávamos perder a nossa vida, para encontrá-la. "Porque o que quiser salvar a sua vida, perdê-la-á, mas o que a perder por amor de mim, esse a salvará" (Lucas, IX,24.) Ou ainda: "O que acha a sua vida, a perde; mas o que a perde por minha causa, esse a acha."(Mateus, X, 39.) A lição individual se aplica no plano coletivo. Os cristãos medievais se apegaram aquilo que consideravam como a sua própria vida: os hábitos religiosos antigos, os formalismos que pareciam dar-lhes segurança. Os cristãos reformistas se apegaram aos textos. Mas para encontrar a vida, era necessário ainda um último desapego, a libertação final, que devolveria ao Cristianismo a sua essência desfigurada pelas amoldagens humanas. O Cristianismo tinha também de ouvir a lição do Cristo: perder a sua vida formal e literal, para encontrá-la em espírito e verdade.
Coube ao Consolador, como o próprio Cristo anunciara, a tarefa de produzir esse rompimento final. "Em verdade vos digo - anunciou o Espírito da Verdade - que são chegados os tempos em que todas as coisas devem ser restabelecidas no seu exato sentido, para dissipar as trevas, confundir os orgulhosos e glorificar os justos". Em O livro dos Espíritos na resposta dada à pergunta 627, encontramos a mesma afirmação, com maiores esclarecimentos. Não só os textos sagrados do Cristianismo, mas todos os grandes textos sagrados e sistemas filosóficos, afirma o Espírito, "encerram os germens de grandes verdades", que podem ser libertados, "graças à chave que o Espiritismo fornece". Na introdução de O Evangelho Segundo o Espiritismo, logo nas primeiras linhas, Kardec oferece um exemplo da maneira pela qual o espiritismo "quebra a noz para tirar a amêndoa", segundo uma sua expressão. O respeito aos textos não se refere à forma, mas ao conteúdo. O Espiritismo respeita a essência, os ensinos contidos na letra, o espírito que nelas se incorpora, e não a própria letra.
Analisando os textos evangélicos, Kardec afirma: "a matéria contida nos Evangelhos pode ser dividida em cinco partes: os atos ordinários da vida do Cristo; os milagres; as profecias; as palavras que serviram para o estabelecimento dos dogmas da Igreja; e o ensino moral. As quatro primeiras serviram para controvérsias, mas a última subsiste inatacável". Logo mais, esclarece: "Essa parte constitui o objeto exclusivo da presente obra". A noz foi quebrada e a amêndoa retirada. O arcabouço literal foi rompido, para que o espirito se libertasse da letra.
Os próprios adeptos do Espiritismo, em geral, não percebem a grandeza dessa atitude e lamentam que Kardec não fizesse um estudo minucioso dos textos, analisando vírgula por vírgula. Outros, achando que Kardec fez pouco, preferem embrenhar-se no cipoal de Os Quatro Evangelhos, de Roustaing, aceitando as mais esdrúxulas interpretações de passagens evangélicas. Tudo por quê? Simplesmente porque continuam "apegados a sua vida", subjugados pela fascinação da letra, em vez de se entregarem ao espírito dos ensinos, que Kardec libertou, num trabalho inspirado e orientado pelas mais elevadas forças espirituais que o nosso mundo já teve a oportunidade de conhecer.
As escrituras são encaradas pelo Espiritismo como elaborações proféticas, ou seja, como produtos mediúnicos das chamadas épocas de revelação. Nessas épocas, que assinalaram os momentos decisivos, ou pelo menos importantes, da evolução humana, as figuras proféticas de Hermes, de Moisés, de Buda, de Maomé, revelaram aos homens alguns aspectos ocultos do processo da vida, ensinando-lhes princípios de orientação espiritual. Todas as escrituras sagradas, por isso mesmo, "encerram os germens de grandes verdades". Nos livros do Cristianismo, que incluem os livros fundamentais do Judaísmo, esses germens aparecem de maneira mais acessível a nós, por se dirigirem especialmente ao nosso tempo, através do processo histórico da evolução cristã.
É nesse sentido que o Espiritismo respeita as escrituras, e nelas se apóia, para confirmar a sua própria legitimidade, mas a elas não se escraviza. Pelo contrário, o Espiritismo recebe as escrituras como um acervo cultural, do qual retira as energias criadoras, as forças vitais condensadas em suas formas, para reelaborá-las em novas expressões de espiritualidade. É assim que o Cristianismo se liberta e se renova, na expansão de suas mais profundas e poderosas energias, para libertar e renovar o mundo.
J. Herculano Pires
A mesma espada que dividiu os judeus na era apostólica, a partir da pregação do Cristo, o mesmo fogo que lavrou no seio do Judaísmo, devastando a sua unidade apática, haviam também de dividir os cristãos e calcinar o dogmatismo fideísta da nova estagnação religiosa. A "religião estática" cederia lugar aos impulsos revitalizadores da "religião dinâmica", desse "élan vital" que teria de romper as estruturas materiais, para que a "religião em espírito e verdade" pudesse triunfar dos formalismos dominantes. Lutero sentia profundamente essa verdade, embora ainda não pudesse compreendê-la em plenitude. Erasmo a compreendeu, mas não a sentiu com a intensidade suficiente para impulsioná-lo à ação. Esse desajuste, entretanto, era necessário ao desenvolvimento do processo histórico, que não poderia prescindir das fases que caracterizam o desenrolar da história. A revolução luterana consolidou-se com o código de vinte e oito artigos da Confissão de Augsburg, elaborado por Melanchton, e expandiu-se rapidamente pela Alemanha e os países nórdicos, tornando-se religião estatal. Lutero pretendia substituir os símbolos medievais pela verdade evangélica, substituir o aparelhamento do culto pela presença do Cristo. Era um impulso decisivo de volta às origens cristãs. Mas as próprias circunstâncias apresentavam obstáculos diversos a esse retorno ideal. O luteranismo não conseguiu abolir completamente a simbólica religiosa do catolicismo-romano e terminou adaptando uma parte da mesma. Conservou os três sacramentos que considerava fundamentais: o batismo, a comunhão e a penitência, e manteve a organização sacerdotal. Mas o mais curioso da Reforma foi à substituição de uma idolatria por outra. Em lugar dos ídolos, das relíquias, do instrumental variado do culto, do dogmatismo dos concílios e da autoridade papal, o luteranismo consagrou a idolatria da letra, a infalibilidade dos textos sagrados.
Paulo, o apóstolo, já havia ensinado que a letra mata e somente o espírito vivifica. Mas também a liberdade subitamente conquistada pode matar. Livrando-se do peso morto dos ídolos materiais que atravancam a religião medieval, os reformadores da Renascença deviam apegar-se forçosamente a alguma coisa. Essa nova base, sobre a qual deviam firmar-se para prosseguir na luta, foi a "Palavra de Deus", consubstanciada nos textos da Escritura. A Reforma estabeleceu o império do literalismo, o domínio da letra. Jamais o Cristianismo europeu fizera tanto jus à denominação da "religião do livro", que os maometanos lhe haviam dado. Nos templos reformados, a Bíblia substituiu a imagem. É fácil compreendermos que um grande passo estava dado, pois libertar a letra era a medida indispensável para conseguir-se a libertação do espírito, nela encerrado.
O "verdadeiro evangelho", de que Erasmo falara a Frederico da Saxônia, surgiu sobre a Europa nas múltiplas traduções para as línguas nacionais, a partir da germânica. Os textos ocultos, até então privilégio dos clérigos eram retirados das criptas e oferecidos ao povo, que os recebia com sofreguidão. A possibilidade de contato direto com a Escritura, o direito de sentir o seu poder inspirador nos próprios textos, sem as interpretações clericais, eis a novidade que abalava o Cristianismo e abria perspectivas imprevisíveis para o seu desenvolvimento. Foi essa a missão espiritual da Reforma. Sem o florescimento da seara cristã, sem essa floração magnífica do Evangelho, por toda parte, não poderiam chegar ao tempo dos frutos e da colheita, que viria mais tarde, quando se cumprisse a Promessa do Consolador.
Na França e na Suíça, Zwinglio e Calvino se incumbiram de dar prosseguimento à Reforma, que se estendeu rapidamente aos Países Baixos e à Escócia. Calvino parece ter sentido ainda, mais fundamento que Lutero, a necessidade de libertar o Cristianismo da asfixia dos símbolos. Apegou-se, entretanto, ao dogma da predestinação, e seu fanatismo atingiu às raias da brutalidade, com terríveis episódios de violência. Não obstante, sua contribuição resultou no vigoroso surto do liberalismo protestante, iluminado pela influência do criticismo kantiano. Na Inglaterra, a libertação do domínio papal, efetuada por Henrique VIII e consolidada pela rainha Elisabete, não chegou a atingir a profundidade das reformas de Lutero e Calvino. A igreja Anglicana, dominada pelo soberano nacional, conservou enorme acervo da herança medieval.
De qualquer maneira, a reforma estendeu-se por toda parte, deitou raízes na América, e obrigou a Igreja a também se reformar, através do Concílio de Trento, em suas três sessões sucessivas. O movimento da Contra-Reforma apresentou duas faces contraditórias: uma negativa, com a instituição do Santo Ofício, o estabelecimento da Inquisição; outra positiva, com o trabalho educacional da Companhia de Jesus. A primeira face correspondia à indignação do fanatismo ferido; a Segunda, à compreensão da inteligência eclesiástica, alertada pela prudência de Erasmo, de que novos tempos haviam surgido e novas aspirações sacudiam vigorosamente os povos. A impetuosidade de Lutero produzira os resultados necessários. O fogo ateado pelo Cristo se reacendera nos corações, até então amortalhados pela rotina secular. Uma nova terra e um novo céu começavam a aparecer, segundo a previsão apocalíptica. E a partir do século dezoito, o clima estava preparado para o segundo grande passo do Cristianismo, que seria dado com a superação do literalismo; a libertação do espírito. Caberia a Kardec, a serviço do Consolador, libertar da letra que mata o espírito que vivifica.
RUPTURA DO ARCABOUÇO LITERAL
A posição do Espiritismo, em face dos textos sagrados do Cristianismo, parece ambígua. Ao mesmo tempo em que se apóia nos textos, a doutrina, a partir de Kardec, e por seus mais autorizados divulgadores, também os critica. Nada mais coerente com a natureza declaradamente racional do Espiritismo, com a sua orientação analítica, e portanto científica. A ambigüidade apontada pelos opositores não é mais do que o uso da liberdade de exame, sem o qual o Espiritismo teria de submeter-se ao dogmatismo literalista, incapaz de libertar, da prisão da letra, o espírito que vivifica. Admitir o absolutismo das Escrituras seria frustrar a evolução do Cristianismo, nos rumos da plena espiritualidade, que constitui ao mesmo tempo a sua essência e o seu destino, o seu objetivo.
O Cristianismo Primitivo aprendera a libertar das escrituras judaicas o seu conteúdo espiritual, como vemos nas epístolas apostólicas e nos próprios textos evangélicos. Estes textos, por sua vez, apresentam-se na forma livre de anotações, testemunhando a liberdade espiritual do ensino do Cristo, que não se prendia a nenhum esquema literal dotado de rigidez. Não obstante, o cristianismo medieval construiu um rígido arcabouço literal, no qual prendeu e abafou, sob os demais arcabouços da imensa construção da Igreja, a essência dos ensinos cristãos, o seu livre espírito. A Reforma, rompendo os arcabouços da superestrutura, não teve forças para romper o da infra-estrutura, por entender que neste se encontrava a base do Cristianismo. Romper o arcabouço literal seria como destruir os alicerces do edifício.
Era natural que assim acontecesse, pois os reformadores do Renascimento não poderiam ir até as últimas conseqüências. Primeiro, porque a sua ação estava naturalmente limitada pelas possibilidades da época; e depois, porque ela se destinava a preparar condições para o novo impulso a ser dado. Somente o reconhecimento das manifestações espíritas, o estudo desses fenômenos e a aceitação racional das comunicações esclarecedoras, dadas por via mediúnica, poderiam levar ao rompimento do arcabouço literal, última forma concreta em que o espírito cristão se refugiava. Podemos compreender o apego dos literalistas à "Palavra de Deus", quando nos lembramos dessa lei de inércia que nos amarra aos velhos hábitos. Melhor ainda o compreendemos, ao pensar na sensação de insegurança que devem ter sentido os reformistas, na proporção em que demoliam os arcabouços do velho e poderoso edifício, no qual por tantos séculos se abrigara a fé de seus antepassados e a deles mesmos.
O Cristo ensinara, com absoluta clareza, segundo as anotações evangélicas, que precisávamos perder a nossa vida, para encontrá-la. "Porque o que quiser salvar a sua vida, perdê-la-á, mas o que a perder por amor de mim, esse a salvará" (Lucas, IX,24.) Ou ainda: "O que acha a sua vida, a perde; mas o que a perde por minha causa, esse a acha."(Mateus, X, 39.) A lição individual se aplica no plano coletivo. Os cristãos medievais se apegaram aquilo que consideravam como a sua própria vida: os hábitos religiosos antigos, os formalismos que pareciam dar-lhes segurança. Os cristãos reformistas se apegaram aos textos. Mas para encontrar a vida, era necessário ainda um último desapego, a libertação final, que devolveria ao Cristianismo a sua essência desfigurada pelas amoldagens humanas. O Cristianismo tinha também de ouvir a lição do Cristo: perder a sua vida formal e literal, para encontrá-la em espírito e verdade.
Coube ao Consolador, como o próprio Cristo anunciara, a tarefa de produzir esse rompimento final. "Em verdade vos digo - anunciou o Espírito da Verdade - que são chegados os tempos em que todas as coisas devem ser restabelecidas no seu exato sentido, para dissipar as trevas, confundir os orgulhosos e glorificar os justos". Em O livro dos Espíritos na resposta dada à pergunta 627, encontramos a mesma afirmação, com maiores esclarecimentos. Não só os textos sagrados do Cristianismo, mas todos os grandes textos sagrados e sistemas filosóficos, afirma o Espírito, "encerram os germens de grandes verdades", que podem ser libertados, "graças à chave que o Espiritismo fornece". Na introdução de O Evangelho Segundo o Espiritismo, logo nas primeiras linhas, Kardec oferece um exemplo da maneira pela qual o espiritismo "quebra a noz para tirar a amêndoa", segundo uma sua expressão. O respeito aos textos não se refere à forma, mas ao conteúdo. O Espiritismo respeita a essência, os ensinos contidos na letra, o espírito que nelas se incorpora, e não a própria letra.
Analisando os textos evangélicos, Kardec afirma: "a matéria contida nos Evangelhos pode ser dividida em cinco partes: os atos ordinários da vida do Cristo; os milagres; as profecias; as palavras que serviram para o estabelecimento dos dogmas da Igreja; e o ensino moral. As quatro primeiras serviram para controvérsias, mas a última subsiste inatacável". Logo mais, esclarece: "Essa parte constitui o objeto exclusivo da presente obra". A noz foi quebrada e a amêndoa retirada. O arcabouço literal foi rompido, para que o espirito se libertasse da letra.
Os próprios adeptos do Espiritismo, em geral, não percebem a grandeza dessa atitude e lamentam que Kardec não fizesse um estudo minucioso dos textos, analisando vírgula por vírgula. Outros, achando que Kardec fez pouco, preferem embrenhar-se no cipoal de Os Quatro Evangelhos, de Roustaing, aceitando as mais esdrúxulas interpretações de passagens evangélicas. Tudo por quê? Simplesmente porque continuam "apegados a sua vida", subjugados pela fascinação da letra, em vez de se entregarem ao espírito dos ensinos, que Kardec libertou, num trabalho inspirado e orientado pelas mais elevadas forças espirituais que o nosso mundo já teve a oportunidade de conhecer.
As escrituras são encaradas pelo Espiritismo como elaborações proféticas, ou seja, como produtos mediúnicos das chamadas épocas de revelação. Nessas épocas, que assinalaram os momentos decisivos, ou pelo menos importantes, da evolução humana, as figuras proféticas de Hermes, de Moisés, de Buda, de Maomé, revelaram aos homens alguns aspectos ocultos do processo da vida, ensinando-lhes princípios de orientação espiritual. Todas as escrituras sagradas, por isso mesmo, "encerram os germens de grandes verdades". Nos livros do Cristianismo, que incluem os livros fundamentais do Judaísmo, esses germens aparecem de maneira mais acessível a nós, por se dirigirem especialmente ao nosso tempo, através do processo histórico da evolução cristã.
É nesse sentido que o Espiritismo respeita as escrituras, e nelas se apóia, para confirmar a sua própria legitimidade, mas a elas não se escraviza. Pelo contrário, o Espiritismo recebe as escrituras como um acervo cultural, do qual retira as energias criadoras, as forças vitais condensadas em suas formas, para reelaborá-las em novas expressões de espiritualidade. É assim que o Cristianismo se liberta e se renova, na expansão de suas mais profundas e poderosas energias, para libertar e renovar o mundo.
J. Herculano Pires
25 junho 2009
ENTRE A FRANÇA E O BRASIL:a invenção de tradições
Allan Kardec ainda escrevia os principais tomos de sua obra, quando o Espiritismo aportou ao Brasil, sendo, portanto, divulgado quase simultaneamenteà sua difusão na Europa10. Os estudos sociológicos aqui realizados sobre o tema, no entanto, são relativamente recentes. Dois autores, Cândido Procópio Camargo11 e Roger Bastide12, assinam os primeiros trabalhos, introduzindo a questão que nortearia boa parte da discussão dos estudos de religião nos anos 60 e 70: como explicar a difusão de religiões populares, especialmente o Pentecostalismo, o Espiritismo e as religiões afro-brasileiras, num contexto de aceleração do processo de urbanização? Ou em outros termos: como explicar a proliferação da religiosidade popular, tida como símbolo de "atraso", justamente no pólo do desenvolvimento urbano e econômico do país, ou seja, no espaço social e simbólico tido como emblemático da "modernidade"?
Inaugurando a discussão desse tema, esses autores se tornaram referência de toda a produção subseqüente13. Dentre as idéias que postulam, tornaram corrente a assertiva de que o Espiritismo sofreu uma significativa mudança no processo de sua transplantação para o Brasil, considerando-se que na França, onde teve origem, prevalecia a ênfase na dimensão experimental e científica da doutrina, enquanto no Brasil tornou-se dominante a feição mística, religiosa.
Cândido Procópio Camargo sustenta essa idéia já às primeiras páginas do seu livro Kardecismo e Umbanda. Neste afirma: "A ênfase no aspecto religioso da obra de Kardec constitui [...] o traço distintivo do Espiritismo brasileiro e, talvez, seja a causa de seu sucesso entre nós" (1961: 4). Afirmação que reitera adiante, quando declara:
Tanto a doutrina, como especialmente a prática espírita, ganharam no Brasil novo alento, desenvolvendo conotações e ênfases especiais que as adaptaram à realidade brasileira. A história dessa adaptação é um aspecto [...] da constituição de uma religião original entre nós. (: 8; destaques meus)
Alguns anos mais tarde Procópio Camargo reapresenta essa idéia em seu novo livro, Católicos, espíritas e protestantes (1963). Nesta obra o autor sugere que a doutrina kardecista "não sofreu modificações essenciais quando transplantada para a sociedade brasileira, embora a adaptação a uma situação social nova tenha gerado algumas características especiais" (: 162; destaques meus). Dentre estas últimas destaca o fato de que "no Brasil o aspecto religioso torna-se preponderante, em contraposição ao filosófico e científico" (idem; destaques meus). O autor atribui essa mudança de ênfase doutrinária à "tradição cultural brasileira", caracterizada como "impregnada de um estilo sacral de compreender a realidade" (1961: 112). Donde conclui que esta é uma sociedade "moderna", porém, contraditória: "embora a cultura brasileira seja naturalmente complexa" e, portanto, oriente-se "também por valores estritamente racionais e profanos, cremos não ser exagerado afirmar que a solução sacral para a vida assume, entre nós, importância considerável" (idem; destaque meu).
Roger Bastide partilha dessa idéia, mas envereda a análise noutra direção. Ele sugere que o Espiritismo sofreu interpretações diversas na sociedade brasileira, segundo a classe social. Segundo ele, os segmentos de classe alta, "intelectualizados", tendem a enfatizar as experiências de tipo científico. Já o Espiritismo praticado nos centros, que concentra os segmentos de classe média, caracteriza-se por um cunho acentuadamente religioso. Mas a ênfase de suas práticas é terapêutica, tal como se observa entre os segmentos populares. Com relação a estes últimos, porém, ressalva: "Aqui [...] o caráter médico do espiritismo continua, tanto mais que a tradição do curador, da magia curativa, de definição da doença pela ação mística de feiticeiros ou da vingança dos mortos, permanece a base da mentalidade primitiva" (1985[1960]: 433).
A ênfase no aspecto terapêutico, associado a noções mágicas, constitui, portanto, o diferencial do Espiritismo brasileiro. Mas embora Bastide sinalize cortes raciais e/ou de classe na interpretação da doutrina espírita, conclui generalizando: "Em suma, o espiritismo foi transformado pelo meio brasileiro, meio [este] mais confiante no 'curandeiro' que no médico e que não separa o sobrenatural da natureza" (idem).
Divergentes, as duas linhas de interpretação angariaram inúmeros seguidores. Não cabe aqui, porém, reconstruir genealogias. Importa sinalizar que a perspectiva comparativa, relacional, que inaugura a análise do fenômeno, tornou-se o modo corrente pelo qual passou a se pensar a história do Espiritismo no Brasil.
Dentre as imagens resultantes interessa-me retomar uma que se tornou corrente, dentro e fora dos meios acadêmicos. Refiro-me ao suposto, com base nas análises acima, de que no Brasil a doutrina kardecista sofreu uma distorção. Autores nacionais bem como estrangeiros partilham dessa posição. Revisões recentes de processos de confronto cultural permitem, no entanto, recolocar a questão em outros termos. Ou seja, considerar deslocamentos de ênfases doutrinárias como distorção ou adulteração de um modelo original obscurece o fato de que toda versão, toda reinterpretação é sempre um ato criativo. Sahlins, em seu livro Ilhas de história, chama atenção para essa questão ao afirmar que a ordem cultural não é estática, mas alterada na ação, isto é, sujeita a riscos empíricos. Isso porque agindo a partir de perspectivas diferentes e com poderes sociais diversos para a objetivação de suas interpretações, as pessoas chegam a diferentes conclusões e as sociedades elaboram os consensos, cada qual à sua maneira. A comunicação social é [portanto] um risco [...]. E os efeitos desses riscos podem ser inovações radicais. (1990: 10; destaque meu)
Tratar a experiência do confronto cultural, mais especificamente a diversidade de respostas locais ao sistema mundial dessa perspectiva, fornece uma pista para se pensar as especificidades assumidas pelo Espiritismo no Brasil a partir de um novo enfoque. Ou seja, argumentando com Sahlins, é possível afirmar que privilegiar determinadas práticas assim como deslocar a ênfase de certos preceitos doutrinários envolvem um ato criativo. Trata-se de reinterpretação, isto é, de uma particularização cultural e histórica de idéias e práticas concebidas com pretensão de universalidade. Nesse sentido, o Espiritismo à brasileira seria uma versão original e não um produto menor, adulterado ou desviante.
Resta saber como se construiu essa originalidade.
Construindo laços, definindo fronteiras: Espiritismo, Catolicismo e as religiões afro
A literatura mencionada tende a situar o Espiritismo no campo religioso brasileiro a partir da interlocução por este estabelecida com as religiões de tradição afro. Essa perspectiva de análise engendrou duas posturas distintas: 1) de um lado, há autores que pensam as relações entre o Espiritismo e as religiões de tradição afro em termos de um continuum – isto é, como variação empírica de um mesmo princípio de estruturação cosmológica e de produção da experiência religiosa (Camargo,1963 e 1973; Birman, 1995); 2) outros concebem o Espiritismo por oposição às religiões afro-brasileiras, uma espécie de espelho invertido, seja quanto às suas características sociais e étnicas, seja quanto à estrutura ritual e doutrinária (Maggie, 1992; Ortiz, 1991 [1978]; dentre outros).
Esses enfoques que fazem dos cultos de possessão uma unidade, pelo princípio da afinidade ou pelo princípio da oposição são, sem dúvida, pertinentes. No entanto, tal recorte tende a omitir ou, pelo menos, a relegar a um segundo plano as relações estabelecidas entre o Espiritismo e o Catolicismo, religião ainda hegemônica no país. É o que se verifica, por exemplo, no estudo de Maria Laura Cavalcanti (1983), para quem a questão sequer se coloca. Outros autores se referem ao tema sem problematizá-lo, como Renato Ortiz, para quem as relações entre Espiritismo e Catolicismo são tidas como dadas: "Consideramos a influência do catolicismo como sendo implícita", diz ele (1991 [1978] : 34). Cândido Procópio Camargo também partilha dessa posição: "[...] no kardecismo predomina a formulação ética de inspiração cristã" (1963), diz ele, sem se preocupar em qualificar o modo como esta foi apropriada e/ou reinterpretada pelo Espiritismo.
Uma das lacunas da produção sobre o tema consiste justamente no fato de não se questionar como o imaginário e as práticas católicas impactaram o Espiritismo, influenciando de forma significativa o modo de sua expressão no Brasil. Aubrée e Laplantine (1990) fazem menção a essa questão ao sugerirem que o modo como os brasileiros se relacionam com os espíritos não faz mais que "prolongar, ampliar e sistematizar o que se poderia chamar de cultura brasileira dos espíritos" (: 85), cujo principal traço seria a "intimidade com os santos, eguns e orixás" (idem). Mas também esses autores não avançam a discussão e acabam realçando, como os demais, as relações entre o Espiritismo e as religiões de tradição afro.
O que se perde de vista nessas análises é a complexidade das relações estabelecidas pelo Espiritismo no campo religioso brasileiro, em particular aquelas que dizem respeito às disputas e negociações realizadas com a religião dominante, hegemônica no país14. Privilegio essa relação uma vez que considero, em oposição à tradição consolidada na literatura, que o Espiritismo definiu sua identidade elegendo como sinais diacríticos elementos do universo católico. Isso significa afirmar que sua relação com a religião dominante no país não se resumiu simplesmente ao endosso de certas idéias ou práticas rituais, como sugerem autores acima mencionados. O "matiz perceptivelmente católico" do Espiritismo brasileiro decorre, conforme pretendo demonstrar, da incorporação de um dos substratos fundamentais da cultura religiosa ocidental: a noção cristã de santidade.
Chico Xavier configura nesse contexto, como pretendemos demonstrar adiante, um paradigma dessa construção. No cenário contemporâneo, porém, é possível, vislumbrar novas tendências. Mas estas reforçam o argumento acima, uma vez que é em larga medida contra esse "viés católico" de que se revestiu o Espiritismo brasileiro que começaram a emergir, a partir dos anos 80, novas tendências de filiação nesse campo.
O presente artigo ilustra essas diferentes versões que hoje convivem no campo espírita a partir da análise da trajetória de três personagens: 1) Chico Xavier, o primeiro deles, ilustra a construção da "tradição" espírita brasileira, cuja marca consiste na síntese com o Catolicismo; 2) Luiz Antonio Gasparetto e 3) Waldo Vieira sintetizam, cada um à sua maneira, tendências da crítica contemporânea a esse modelo que se tornou hegemônico, o primeiro realizando-a por meio da busca de diálogo com temas e práticas do chamado neo-esoterismo15 e do universo da auto-ajuda, enquanto o segundo enveredou em busca de uma nova síntese com a ciência.
Apresento-os aqui em contraponto, a partir da construção narrativa de suas biografias, sem ter a intenção de contextualizar historicamente suas trajetórias pessoais. Clifford Geertz já advertia, em Observando el Islam, que "observar a história a partir de personalidades, especialmente personalidades dramáticas, é sempre perigoso"(1994 [1968]: 97). O risco do empreendimento, porém, justifica-se, diz ele, quando se trata de personagens cujas carreiras sintetizam um determinado período da história de seus países. Entendendo ser este o caso, decidi assumir o risco.
Inaugurando a discussão desse tema, esses autores se tornaram referência de toda a produção subseqüente13. Dentre as idéias que postulam, tornaram corrente a assertiva de que o Espiritismo sofreu uma significativa mudança no processo de sua transplantação para o Brasil, considerando-se que na França, onde teve origem, prevalecia a ênfase na dimensão experimental e científica da doutrina, enquanto no Brasil tornou-se dominante a feição mística, religiosa.
Cândido Procópio Camargo sustenta essa idéia já às primeiras páginas do seu livro Kardecismo e Umbanda. Neste afirma: "A ênfase no aspecto religioso da obra de Kardec constitui [...] o traço distintivo do Espiritismo brasileiro e, talvez, seja a causa de seu sucesso entre nós" (1961: 4). Afirmação que reitera adiante, quando declara:
Tanto a doutrina, como especialmente a prática espírita, ganharam no Brasil novo alento, desenvolvendo conotações e ênfases especiais que as adaptaram à realidade brasileira. A história dessa adaptação é um aspecto [...] da constituição de uma religião original entre nós. (: 8; destaques meus)
Alguns anos mais tarde Procópio Camargo reapresenta essa idéia em seu novo livro, Católicos, espíritas e protestantes (1963). Nesta obra o autor sugere que a doutrina kardecista "não sofreu modificações essenciais quando transplantada para a sociedade brasileira, embora a adaptação a uma situação social nova tenha gerado algumas características especiais" (: 162; destaques meus). Dentre estas últimas destaca o fato de que "no Brasil o aspecto religioso torna-se preponderante, em contraposição ao filosófico e científico" (idem; destaques meus). O autor atribui essa mudança de ênfase doutrinária à "tradição cultural brasileira", caracterizada como "impregnada de um estilo sacral de compreender a realidade" (1961: 112). Donde conclui que esta é uma sociedade "moderna", porém, contraditória: "embora a cultura brasileira seja naturalmente complexa" e, portanto, oriente-se "também por valores estritamente racionais e profanos, cremos não ser exagerado afirmar que a solução sacral para a vida assume, entre nós, importância considerável" (idem; destaque meu).
Roger Bastide partilha dessa idéia, mas envereda a análise noutra direção. Ele sugere que o Espiritismo sofreu interpretações diversas na sociedade brasileira, segundo a classe social. Segundo ele, os segmentos de classe alta, "intelectualizados", tendem a enfatizar as experiências de tipo científico. Já o Espiritismo praticado nos centros, que concentra os segmentos de classe média, caracteriza-se por um cunho acentuadamente religioso. Mas a ênfase de suas práticas é terapêutica, tal como se observa entre os segmentos populares. Com relação a estes últimos, porém, ressalva: "Aqui [...] o caráter médico do espiritismo continua, tanto mais que a tradição do curador, da magia curativa, de definição da doença pela ação mística de feiticeiros ou da vingança dos mortos, permanece a base da mentalidade primitiva" (1985[1960]: 433).
A ênfase no aspecto terapêutico, associado a noções mágicas, constitui, portanto, o diferencial do Espiritismo brasileiro. Mas embora Bastide sinalize cortes raciais e/ou de classe na interpretação da doutrina espírita, conclui generalizando: "Em suma, o espiritismo foi transformado pelo meio brasileiro, meio [este] mais confiante no 'curandeiro' que no médico e que não separa o sobrenatural da natureza" (idem).
Divergentes, as duas linhas de interpretação angariaram inúmeros seguidores. Não cabe aqui, porém, reconstruir genealogias. Importa sinalizar que a perspectiva comparativa, relacional, que inaugura a análise do fenômeno, tornou-se o modo corrente pelo qual passou a se pensar a história do Espiritismo no Brasil.
Dentre as imagens resultantes interessa-me retomar uma que se tornou corrente, dentro e fora dos meios acadêmicos. Refiro-me ao suposto, com base nas análises acima, de que no Brasil a doutrina kardecista sofreu uma distorção. Autores nacionais bem como estrangeiros partilham dessa posição. Revisões recentes de processos de confronto cultural permitem, no entanto, recolocar a questão em outros termos. Ou seja, considerar deslocamentos de ênfases doutrinárias como distorção ou adulteração de um modelo original obscurece o fato de que toda versão, toda reinterpretação é sempre um ato criativo. Sahlins, em seu livro Ilhas de história, chama atenção para essa questão ao afirmar que a ordem cultural não é estática, mas alterada na ação, isto é, sujeita a riscos empíricos. Isso porque agindo a partir de perspectivas diferentes e com poderes sociais diversos para a objetivação de suas interpretações, as pessoas chegam a diferentes conclusões e as sociedades elaboram os consensos, cada qual à sua maneira. A comunicação social é [portanto] um risco [...]. E os efeitos desses riscos podem ser inovações radicais. (1990: 10; destaque meu)
Tratar a experiência do confronto cultural, mais especificamente a diversidade de respostas locais ao sistema mundial dessa perspectiva, fornece uma pista para se pensar as especificidades assumidas pelo Espiritismo no Brasil a partir de um novo enfoque. Ou seja, argumentando com Sahlins, é possível afirmar que privilegiar determinadas práticas assim como deslocar a ênfase de certos preceitos doutrinários envolvem um ato criativo. Trata-se de reinterpretação, isto é, de uma particularização cultural e histórica de idéias e práticas concebidas com pretensão de universalidade. Nesse sentido, o Espiritismo à brasileira seria uma versão original e não um produto menor, adulterado ou desviante.
Resta saber como se construiu essa originalidade.
Construindo laços, definindo fronteiras: Espiritismo, Catolicismo e as religiões afro
A literatura mencionada tende a situar o Espiritismo no campo religioso brasileiro a partir da interlocução por este estabelecida com as religiões de tradição afro. Essa perspectiva de análise engendrou duas posturas distintas: 1) de um lado, há autores que pensam as relações entre o Espiritismo e as religiões de tradição afro em termos de um continuum – isto é, como variação empírica de um mesmo princípio de estruturação cosmológica e de produção da experiência religiosa (Camargo,1963 e 1973; Birman, 1995); 2) outros concebem o Espiritismo por oposição às religiões afro-brasileiras, uma espécie de espelho invertido, seja quanto às suas características sociais e étnicas, seja quanto à estrutura ritual e doutrinária (Maggie, 1992; Ortiz, 1991 [1978]; dentre outros).
Esses enfoques que fazem dos cultos de possessão uma unidade, pelo princípio da afinidade ou pelo princípio da oposição são, sem dúvida, pertinentes. No entanto, tal recorte tende a omitir ou, pelo menos, a relegar a um segundo plano as relações estabelecidas entre o Espiritismo e o Catolicismo, religião ainda hegemônica no país. É o que se verifica, por exemplo, no estudo de Maria Laura Cavalcanti (1983), para quem a questão sequer se coloca. Outros autores se referem ao tema sem problematizá-lo, como Renato Ortiz, para quem as relações entre Espiritismo e Catolicismo são tidas como dadas: "Consideramos a influência do catolicismo como sendo implícita", diz ele (1991 [1978] : 34). Cândido Procópio Camargo também partilha dessa posição: "[...] no kardecismo predomina a formulação ética de inspiração cristã" (1963), diz ele, sem se preocupar em qualificar o modo como esta foi apropriada e/ou reinterpretada pelo Espiritismo.
Uma das lacunas da produção sobre o tema consiste justamente no fato de não se questionar como o imaginário e as práticas católicas impactaram o Espiritismo, influenciando de forma significativa o modo de sua expressão no Brasil. Aubrée e Laplantine (1990) fazem menção a essa questão ao sugerirem que o modo como os brasileiros se relacionam com os espíritos não faz mais que "prolongar, ampliar e sistematizar o que se poderia chamar de cultura brasileira dos espíritos" (: 85), cujo principal traço seria a "intimidade com os santos, eguns e orixás" (idem). Mas também esses autores não avançam a discussão e acabam realçando, como os demais, as relações entre o Espiritismo e as religiões de tradição afro.
O que se perde de vista nessas análises é a complexidade das relações estabelecidas pelo Espiritismo no campo religioso brasileiro, em particular aquelas que dizem respeito às disputas e negociações realizadas com a religião dominante, hegemônica no país14. Privilegio essa relação uma vez que considero, em oposição à tradição consolidada na literatura, que o Espiritismo definiu sua identidade elegendo como sinais diacríticos elementos do universo católico. Isso significa afirmar que sua relação com a religião dominante no país não se resumiu simplesmente ao endosso de certas idéias ou práticas rituais, como sugerem autores acima mencionados. O "matiz perceptivelmente católico" do Espiritismo brasileiro decorre, conforme pretendo demonstrar, da incorporação de um dos substratos fundamentais da cultura religiosa ocidental: a noção cristã de santidade.
Chico Xavier configura nesse contexto, como pretendemos demonstrar adiante, um paradigma dessa construção. No cenário contemporâneo, porém, é possível, vislumbrar novas tendências. Mas estas reforçam o argumento acima, uma vez que é em larga medida contra esse "viés católico" de que se revestiu o Espiritismo brasileiro que começaram a emergir, a partir dos anos 80, novas tendências de filiação nesse campo.
O presente artigo ilustra essas diferentes versões que hoje convivem no campo espírita a partir da análise da trajetória de três personagens: 1) Chico Xavier, o primeiro deles, ilustra a construção da "tradição" espírita brasileira, cuja marca consiste na síntese com o Catolicismo; 2) Luiz Antonio Gasparetto e 3) Waldo Vieira sintetizam, cada um à sua maneira, tendências da crítica contemporânea a esse modelo que se tornou hegemônico, o primeiro realizando-a por meio da busca de diálogo com temas e práticas do chamado neo-esoterismo15 e do universo da auto-ajuda, enquanto o segundo enveredou em busca de uma nova síntese com a ciência.
Apresento-os aqui em contraponto, a partir da construção narrativa de suas biografias, sem ter a intenção de contextualizar historicamente suas trajetórias pessoais. Clifford Geertz já advertia, em Observando el Islam, que "observar a história a partir de personalidades, especialmente personalidades dramáticas, é sempre perigoso"(1994 [1968]: 97). O risco do empreendimento, porém, justifica-se, diz ele, quando se trata de personagens cujas carreiras sintetizam um determinado período da história de seus países. Entendendo ser este o caso, decidi assumir o risco.
23 junho 2009
O ESPIRITISMO SEGUNDO CHICO XAVIER
Personagem paradigmática do Espiritismo brasileiro, Chico Xavier é aqui considerado um dos principais responsáveis pela consolidação da "feição católica" de que se revestiu o Espiritismo no Brasil16. Essa síntese foi por ele produzida pela introdução tanto de práticas populares como institucionais do Catolicismo na performance espírita. Síntese que Chico Xavier realiza, na sua biografia, por duas vias: por um lado, a relação santorial, que caracteriza o Catolicismo popular, serviu-lhe de modelo para a construção e narrativa de sua experiência com os espíritos; por outro, sua imagem pública – o ideal de santidade que conforma o seu estilo de vida –, inspira-se em princípios da prática monástica católica. É o que pretendo demonstrar revendo alguns aspectos de sua biografia.
Uma vida contada a muitas mãos
Autor de mais de 400 títulos espíritas, Chico Xavier pouco escreveu sobre si mesmo. Dois prefácios, escritos nos anos 30, foram os únicos documentos encontrados. Há, porém, inúmeras biografias produzidas ao longo de sua carreira que compilam casos, episódios e eventos contados, em primeira mão, pelo próprio Chico Xavier. Assim, por meio de terceiros a sua narrativa foi transformada numa espécie de "história oficial".
Uma das características desse relato é que ele se constrói em torno de uma única chave: a do sofrimento. Essa categoria narrativa estabelece laços de continuidade entre as etapas fundamentais de sua carreira e trajetória pessoal, cuja estrutura reproduz o modelo hagiográfico: 1) a fase profana, período que engloba a sua infância e adolescência, é marcada por conflitos surgidos no âmbito familiar e das relações primárias. Nessa etapa o modo de interpretação da experiência mediúnica é característico: tal como na história de vida de outros médiuns, esta é uma experiência rejeitada; 2) a conversão ao Espiritismo marca o início de uma nova etapa, de liminaridade, em que o afastamento do mundo é sinalizado pela tensão entre projetos pessoais e a imposição de um rígido programa de disciplinamento moral e de manejo dos "dons"; 3) a consolidação de sua liderança no campo espírita, associada à produção literária intensa, marca simbolicamente o itinerário de retorno19. Nessa etapa, assumindo a vida como cumprimento de uma missão, a renúncia a projetos de caráter pessoal se consolida fazendo-se acompanhar da produção de um estilo de vida exemplar.
Nesse percurso o confronto inicial com o imaginário católico e, posteriormente, a reinterpretação e apropriação de idéias e práticas deste constituem uma marca fundamental. Esse processo não envolve, porém, apenas a incorporação de práticas do Catolicismo popular, mas também do Catolicismo institucional, eclesiástico, o que se torna sobretudo relevante na terceira etapa de sua trajetória como se verá adiante.
"Com o diabo no corpo": a interpretação católica do fenômeno mediúnico
Nascido a 2 de abril de 1910, em Pedro Leopoldo, Minas Gerais, Chico Xavier teve uma educação eminentemente católica como era corrente entre os moradores do lugar. Mas já na infância, segundo seus relatos, começaram a ocorrer as primeiras manifestações de "contato com os espíritos".
O evento propulsor foi a morte de sua mãe, fato ocorrido em 1915, quando ele tinha apenas cinco anos. João Cândido, seu pai, era vendedor de bilhetes de loteria e viajava muito. Vendo- se, portanto, sem condições de criar os filhos sozinho resolveu distribuí-los entre parentes e vizinhos. Chico Xavier foi entregue à Rita de Cássia, sua madrinha, mais tarde sarcasticamente por ele definida como "grande educadora". De acordo com seus relatos ela o surrava com vara de marmelo todos os dias. Muitas vezes sem motivo. Os castigos, porém, aumentaram depois que ele contou-lhe "ter visto e conversado com a mãe no fundo do quintal". A partir daí, além da surras, a madrinha passou a dar-lhe garfadas na barriga acusando-o, em função de suas "conversas com os mortos", de "ter parte com o diabo". Esse suplício durou dois anos.
Depois disso Chico voltou a morar com o pai, que se casara novamente. A reestruturação da vida familiar não interrompeu, porém, a ocorrência das "visões". Segundo se conta, freqüentemente ele "levantava no meio da noite, batia papo com fantasmas e muitas vezes estragava o café da manhã do pai com notícias de parentes mortos e descrições de viagens por cenários fantásticos" (Souto Maior, 1995: 16). Essas experiências ele também relatava, em confissão, ao padre Scarzelli, pároco da cidade.
Sua madrasta, Cidália, com quem ele conversava nos fins de tarde ao pé do tanque, por inúmeras vezes ouviu-o dizer que "via próximas ao varal figuras cobertas com mantos coloridos" (: 17). Ela, segundo se conta, dava-lhe crédito, ao contrário de dona Rosária, sua professora primária. Ao participar de um concurso de redação instituído pelo governo do Estado de Minas Gerais em comemoração ao primeiro centenário da Independência, Chico levantou-se em meio à prova para comunicar à professora que pressentia a presença de um homem que lhe ditava um texto. Sem dar-lhe muita atenção, ela pediu que ele voltasse ao seu lugar e terminasse a prova. A notícia, porém, espalhou-se na sala e na aula seguinte os colegas fizeram-lhe um desafio. Como prova queriam que o "tal homem" viesse "outra vez, ali mesmo [...] à frente de todos para escrever sobre um tema escolhido por eles". O tema proposto, escolhido ao acaso por um dos meninos foi o grão de areia. Chico relata: "lembro-me que o espírito [...] ao meu lado começou ditando: 'Meus filhos, que ninguém escarneça da criação. O grão de areia é quase nada, mas parece uma estrela'" (Barbosa, 1992 [1967].
Fatos como esses se repetiam quase diariamente, em sonhos, na escola, nos momentos de ócio. João Cândido, pai de Chico Xavier, inúmeras vezes ameaçou internar o filho num sanatório. A tese de que se tratava de caso de loucura era, porém, refutada pelo padre Scarzelli, que procurava aplacar a situação com o receituário católico tradicional: novenas, penitências, rezar mil ave-marias...
Essas duas posições com relação ao fenômeno mediúnico (assinaladas, de um lado, pelo padre e a madrinha nos termos da religião, de outro, pelo pai, que aderia ao argumento médico) ilustram os termos do debate da questão na época. Conforme Giumbelli (1997), que se dedica ao estudo desse tema, as primeiras décadas do século XX constituem o período em que o pensamento médico no Brasil amplia significativamente o espaço editorial conferido ao tema, o que se observa pelo aumento do número de artigos, teses e livros sobre o assunto (: 198). Construindo-se à época como discurso hegemônico, a perspectiva médica teve o endosso do discurso jurídico, resultando dessa aliança um prolongado embate com a versão tradicional, religiosa do fenômeno (Giumbelli, 1994).
Mas numa pequena cidade do interior de Minas Gerais, como era Pedro Leopoldo no início do século XX, o padre era ainda considerado uma "autoridade". Ou seja, a ascendência do padre sobre as famílias dos meios populares corria incontestada. O relato biográfico de Chico Xavier é exemplar nesse sentido. Vários são os episódios relembrados que sugerem o poder da opinião padre. Chico Xavier lembra, por exemplo, que por ordem do pároco participou, aos nove anos, de uma procissão carregando uma pedra de 15 quilos na cabeça. A penitência devia ser complementada pela obrigação de repetir mil vezes a ave-maria. Não se tratava, porém, de prática isolada. Impuseram-lhe que freqüentasse regularmente a igreja, participando inclusive das novenas. Os resultados, contudo, não foram os esperados. Segundo seu relato, enquanto rezava e contava acompanhando a procissão, "um espírito desocupado fazia caretas e bocas para atrapalhar seus cálculos" (Souto Maior, 1994: 11). Além disso, quando estava na igreja, cumprindo as novenas, "assombrações flutuavam sobre os bancos e beijavam os santos" (idem). Padre Scarzelli decidiu então "ser mais duro". Aconselhou João Cândido, pai de Chico, a ocupar o tempo livre do menino, arranjando-lhe um emprego. À época a fábrica de tecidos da cidade estava empregando crianças para trabalhar no período noturno. Chico Xavier foi admitido: "Fui trabalhar como tecelão. Entrava às três da tarde, saía à uma da madrugada. Dormia até às seis, ia para a escola, saía às onze. Almoçava, dormia uma hora [...] e entrava de novo na fábrica" (Machado, 1992[1984]: 25-6). A rotina diária era estafante para uma criança de dez anos. Restava-lhe apenas o fim de semana para descanso e lazer. Algumas atividades, contudo, foram-lhe proibidas: o padre Scarzelli recomendou, como medida complementar, que se evitasse a "má influência" dos livros, revistas e jornais. Assentindo, João Cândido "fez uma fogueira das páginas proibidas" (: 18). Dizendo-se inconformado, Chico relata que recorreu, como sempre fazia, ao espírito da mãe. Esta lhe deu um conselho: "Aprenda a calar-se. Quando lembrar, por exemplo, alguma lição ou experiência recebida em sonho, fique em silêncio. Mais tarde talvez você possa falar" (idem). Chico passou então a restringir seus comentários ao confessionário. Mas o padre Scarzelli insistia: "Ninguém volta a conversar depois da morte" (idem). E acrescentava: "O demônio procura perturbar-lhe o caminho" (idem). Chico, porém, não se deixava convencer: "Mas padre, foi minha mãe quem veio" (idem). O padre retrucava: "Foi o demônio" (idem).
Os exemplos poderiam continuar sendo multiplicados, mas os acima apresentados parecem ser suficientes para evidenciar o peso e significado da interpretação institucional, católica, do fenômeno mediúnico nos meios populares à época. A convergência de leigos e eclesiásticos na interpretação do fenômeno mediúnico chama atenção, considerando-se que o pároco e a madrinha de Chico Xavier o entendem da mesma forma, isto é, como "coisa do diabo". Essa convergência se manifesta também quanto às atitudes assumidas em relação ao fenômeno da mediunidade: ambos entendiam ser preciso reprimi-lo, inibir sua manifestação, num caso por meio de castigos corporais, noutro pela oração e penitência.
Confrontando-se na sua experiência cotidiana com esse caráter prescritivo do Catolicismo oficial em relação ao fenômeno da mediunidade, Chico Xavier desenvolveu nessa etapa inicial de sua trajetória uma relação ambígua com as crenças católicas: sua "carolice de infância" se desenvolveu permeada de experiências que fogem ou são reprimidas pelo Catolicismo oficial, resultando em conflitos pessoais, tanto com representantes da Igreja, como com membros do universo de suas relações de sociabilidade primária.
Sandra Jacqueline Stoll
Professora do Departamento de Antropologia – UFPR
Uma vida contada a muitas mãos
Autor de mais de 400 títulos espíritas, Chico Xavier pouco escreveu sobre si mesmo. Dois prefácios, escritos nos anos 30, foram os únicos documentos encontrados. Há, porém, inúmeras biografias produzidas ao longo de sua carreira que compilam casos, episódios e eventos contados, em primeira mão, pelo próprio Chico Xavier. Assim, por meio de terceiros a sua narrativa foi transformada numa espécie de "história oficial".
Uma das características desse relato é que ele se constrói em torno de uma única chave: a do sofrimento. Essa categoria narrativa estabelece laços de continuidade entre as etapas fundamentais de sua carreira e trajetória pessoal, cuja estrutura reproduz o modelo hagiográfico: 1) a fase profana, período que engloba a sua infância e adolescência, é marcada por conflitos surgidos no âmbito familiar e das relações primárias. Nessa etapa o modo de interpretação da experiência mediúnica é característico: tal como na história de vida de outros médiuns, esta é uma experiência rejeitada; 2) a conversão ao Espiritismo marca o início de uma nova etapa, de liminaridade, em que o afastamento do mundo é sinalizado pela tensão entre projetos pessoais e a imposição de um rígido programa de disciplinamento moral e de manejo dos "dons"; 3) a consolidação de sua liderança no campo espírita, associada à produção literária intensa, marca simbolicamente o itinerário de retorno19. Nessa etapa, assumindo a vida como cumprimento de uma missão, a renúncia a projetos de caráter pessoal se consolida fazendo-se acompanhar da produção de um estilo de vida exemplar.
Nesse percurso o confronto inicial com o imaginário católico e, posteriormente, a reinterpretação e apropriação de idéias e práticas deste constituem uma marca fundamental. Esse processo não envolve, porém, apenas a incorporação de práticas do Catolicismo popular, mas também do Catolicismo institucional, eclesiástico, o que se torna sobretudo relevante na terceira etapa de sua trajetória como se verá adiante.
"Com o diabo no corpo": a interpretação católica do fenômeno mediúnico
Nascido a 2 de abril de 1910, em Pedro Leopoldo, Minas Gerais, Chico Xavier teve uma educação eminentemente católica como era corrente entre os moradores do lugar. Mas já na infância, segundo seus relatos, começaram a ocorrer as primeiras manifestações de "contato com os espíritos".
O evento propulsor foi a morte de sua mãe, fato ocorrido em 1915, quando ele tinha apenas cinco anos. João Cândido, seu pai, era vendedor de bilhetes de loteria e viajava muito. Vendo- se, portanto, sem condições de criar os filhos sozinho resolveu distribuí-los entre parentes e vizinhos. Chico Xavier foi entregue à Rita de Cássia, sua madrinha, mais tarde sarcasticamente por ele definida como "grande educadora". De acordo com seus relatos ela o surrava com vara de marmelo todos os dias. Muitas vezes sem motivo. Os castigos, porém, aumentaram depois que ele contou-lhe "ter visto e conversado com a mãe no fundo do quintal". A partir daí, além da surras, a madrinha passou a dar-lhe garfadas na barriga acusando-o, em função de suas "conversas com os mortos", de "ter parte com o diabo". Esse suplício durou dois anos.
Depois disso Chico voltou a morar com o pai, que se casara novamente. A reestruturação da vida familiar não interrompeu, porém, a ocorrência das "visões". Segundo se conta, freqüentemente ele "levantava no meio da noite, batia papo com fantasmas e muitas vezes estragava o café da manhã do pai com notícias de parentes mortos e descrições de viagens por cenários fantásticos" (Souto Maior, 1995: 16). Essas experiências ele também relatava, em confissão, ao padre Scarzelli, pároco da cidade.
Sua madrasta, Cidália, com quem ele conversava nos fins de tarde ao pé do tanque, por inúmeras vezes ouviu-o dizer que "via próximas ao varal figuras cobertas com mantos coloridos" (: 17). Ela, segundo se conta, dava-lhe crédito, ao contrário de dona Rosária, sua professora primária. Ao participar de um concurso de redação instituído pelo governo do Estado de Minas Gerais em comemoração ao primeiro centenário da Independência, Chico levantou-se em meio à prova para comunicar à professora que pressentia a presença de um homem que lhe ditava um texto. Sem dar-lhe muita atenção, ela pediu que ele voltasse ao seu lugar e terminasse a prova. A notícia, porém, espalhou-se na sala e na aula seguinte os colegas fizeram-lhe um desafio. Como prova queriam que o "tal homem" viesse "outra vez, ali mesmo [...] à frente de todos para escrever sobre um tema escolhido por eles". O tema proposto, escolhido ao acaso por um dos meninos foi o grão de areia. Chico relata: "lembro-me que o espírito [...] ao meu lado começou ditando: 'Meus filhos, que ninguém escarneça da criação. O grão de areia é quase nada, mas parece uma estrela'" (Barbosa, 1992 [1967].
Fatos como esses se repetiam quase diariamente, em sonhos, na escola, nos momentos de ócio. João Cândido, pai de Chico Xavier, inúmeras vezes ameaçou internar o filho num sanatório. A tese de que se tratava de caso de loucura era, porém, refutada pelo padre Scarzelli, que procurava aplacar a situação com o receituário católico tradicional: novenas, penitências, rezar mil ave-marias...
Essas duas posições com relação ao fenômeno mediúnico (assinaladas, de um lado, pelo padre e a madrinha nos termos da religião, de outro, pelo pai, que aderia ao argumento médico) ilustram os termos do debate da questão na época. Conforme Giumbelli (1997), que se dedica ao estudo desse tema, as primeiras décadas do século XX constituem o período em que o pensamento médico no Brasil amplia significativamente o espaço editorial conferido ao tema, o que se observa pelo aumento do número de artigos, teses e livros sobre o assunto (: 198). Construindo-se à época como discurso hegemônico, a perspectiva médica teve o endosso do discurso jurídico, resultando dessa aliança um prolongado embate com a versão tradicional, religiosa do fenômeno (Giumbelli, 1994).
Mas numa pequena cidade do interior de Minas Gerais, como era Pedro Leopoldo no início do século XX, o padre era ainda considerado uma "autoridade". Ou seja, a ascendência do padre sobre as famílias dos meios populares corria incontestada. O relato biográfico de Chico Xavier é exemplar nesse sentido. Vários são os episódios relembrados que sugerem o poder da opinião padre. Chico Xavier lembra, por exemplo, que por ordem do pároco participou, aos nove anos, de uma procissão carregando uma pedra de 15 quilos na cabeça. A penitência devia ser complementada pela obrigação de repetir mil vezes a ave-maria. Não se tratava, porém, de prática isolada. Impuseram-lhe que freqüentasse regularmente a igreja, participando inclusive das novenas. Os resultados, contudo, não foram os esperados. Segundo seu relato, enquanto rezava e contava acompanhando a procissão, "um espírito desocupado fazia caretas e bocas para atrapalhar seus cálculos" (Souto Maior, 1994: 11). Além disso, quando estava na igreja, cumprindo as novenas, "assombrações flutuavam sobre os bancos e beijavam os santos" (idem). Padre Scarzelli decidiu então "ser mais duro". Aconselhou João Cândido, pai de Chico, a ocupar o tempo livre do menino, arranjando-lhe um emprego. À época a fábrica de tecidos da cidade estava empregando crianças para trabalhar no período noturno. Chico Xavier foi admitido: "Fui trabalhar como tecelão. Entrava às três da tarde, saía à uma da madrugada. Dormia até às seis, ia para a escola, saía às onze. Almoçava, dormia uma hora [...] e entrava de novo na fábrica" (Machado, 1992[1984]: 25-6). A rotina diária era estafante para uma criança de dez anos. Restava-lhe apenas o fim de semana para descanso e lazer. Algumas atividades, contudo, foram-lhe proibidas: o padre Scarzelli recomendou, como medida complementar, que se evitasse a "má influência" dos livros, revistas e jornais. Assentindo, João Cândido "fez uma fogueira das páginas proibidas" (: 18). Dizendo-se inconformado, Chico relata que recorreu, como sempre fazia, ao espírito da mãe. Esta lhe deu um conselho: "Aprenda a calar-se. Quando lembrar, por exemplo, alguma lição ou experiência recebida em sonho, fique em silêncio. Mais tarde talvez você possa falar" (idem). Chico passou então a restringir seus comentários ao confessionário. Mas o padre Scarzelli insistia: "Ninguém volta a conversar depois da morte" (idem). E acrescentava: "O demônio procura perturbar-lhe o caminho" (idem). Chico, porém, não se deixava convencer: "Mas padre, foi minha mãe quem veio" (idem). O padre retrucava: "Foi o demônio" (idem).
Os exemplos poderiam continuar sendo multiplicados, mas os acima apresentados parecem ser suficientes para evidenciar o peso e significado da interpretação institucional, católica, do fenômeno mediúnico nos meios populares à época. A convergência de leigos e eclesiásticos na interpretação do fenômeno mediúnico chama atenção, considerando-se que o pároco e a madrinha de Chico Xavier o entendem da mesma forma, isto é, como "coisa do diabo". Essa convergência se manifesta também quanto às atitudes assumidas em relação ao fenômeno da mediunidade: ambos entendiam ser preciso reprimi-lo, inibir sua manifestação, num caso por meio de castigos corporais, noutro pela oração e penitência.
Confrontando-se na sua experiência cotidiana com esse caráter prescritivo do Catolicismo oficial em relação ao fenômeno da mediunidade, Chico Xavier desenvolveu nessa etapa inicial de sua trajetória uma relação ambígua com as crenças católicas: sua "carolice de infância" se desenvolveu permeada de experiências que fogem ou são reprimidas pelo Catolicismo oficial, resultando em conflitos pessoais, tanto com representantes da Igreja, como com membros do universo de suas relações de sociabilidade primária.
Sandra Jacqueline Stoll
Professora do Departamento de Antropologia – UFPR
LUIZ ANTONIO GASPARETTO: entre o Espiritismo, a auto-ajuda e a cosmologia new age
Luiz Antonio Gasparetto seguiu caminho oposto ao de Waldo Vieira, realizando um percurso que é emblemático do carnavalesco, termo empregado aqui tal como utilizado por Da Matta (1981). Sua trajetória segue, em princípio, o mesmo modelo acima observado: a primeira fase é marcada por forte influência de Chico Xavier e da Federação Espírita Brasileira; a segunda envolve o desenvolvimento de um percurso voltado à inovação, prática que, "pelas artes do sincretismo", se concretiza por meio da incorporação de idéias e práticas de auto-ajuda e do universo da chamada Nova Era.
Este é, portanto, um percurso que implica, como no caso anterior, em distanciamento da tradição, embora não configure, como no caso de Waldo Vieira, um total rompimento com o Espiritismo.
Os anos 80 constituem nesse caso o marco da mudança. Por essa época Luiz Gasparetto realizou uma série de viagens à Europa e aos Estados Unidos com a finalidade de promover a divulgação do Espiritismo. As sessões públicas de pintura mediúnica e programas de TV de que participou lhe permitiram observar a atuação de outros médiuns. Numa dessas viagens esteve também em Esalem, o centro new age da Califórnia (EUA), onde entrou em contato com idéias e práticas de diversos sistemas de conhecimento, especialmente com o então chamado "pensamento positivo" e técnicas de psicoterapia corporal. De volta ao Brasil, Luiz Gasparetto começou a se indispor com a Federação Espírita Brasileira. O alvo principal de suas críticas era dirigido ao moralismo espírita, manifesto, entre outros, no tratamento de certos temas, sexo e dinheiro, por exemplo.
Quando viajo para o estrangeiro e converso com os médiuns, os espíritos conversam abertamente de sexo e seus problemas. Aqui não. No Brasil nenhum espírito toca nesse assunto [...]. Aqui só dizem: "vai tomar passe, vai tomar passe!" [...] "apesar dos espíritos terem tentado passar uma mensagem libertadora, aqui os médiuns eram católicos e a linguagem que usaram era própria de sua estrutura mental. Passou o que foi possível. O resto ficou cheio de catolicismo. (Apud Stoll, 1999: 46)
Pouco tempo depois, aliando sua formação de psicólogo à experiência mediúnica, Luiz Gasparetto acabou criando um espaço alternativo de trabalho. Inaugurado em São Paulo nos anos 80, o Espaço Vida e Consciência passou a integrar o circuito dos espaços neo-esotéricos da cidade. Suas atividades regulares são cursos e palestras, às quais se somam shows e workshops, realizados eventualmente.
Por muitos anos Luiz Gasparetto se dividiu entre essas atividades e o exercício da prática da pintura mediúnica no centro Os Caminheiros, dirigido pela sua mãe, Zíbia Gasparetto. Por mais de dez anos a complementaridade definiu o trabalho realizado nesses dois espaços. Ou seja: no centro as atividades obedeciam ao padrão espírita tradicional (realização de sessões públicas de pintura mediúnica e aconselhamento; manutenção de uma creche a título de trabalho de caridade; destinação dos recursos financeiros, oriundos das atividades mediúnicas da família, para esta última); por sua vez, no Espaço Vida e Consciência, local definido como de exercício de atividade de cunho profissional, predominava a realização de atividades em caráter experimental, destacando-se entre estas, cursos e práticas voltados à questão da auto-ajuda. Com essa perspectiva Luiz Gasparetto explorou, nesse "espaço", as mais diversas linguagens. Além de novos usos dados à pintura mediúnica, como o de objeto de cenografia para seus shows, verifica-se a utilização de práticas discursivas diversas, incorporando-se ao seu repertório o uso da música, da expressão corporal, de técnicas de relaxamento e do psicodrama, bem como da representação teatral.
A divulgação das atividades desenvolvidas nesses dois "espaços" contou com recursos diversos de mídia, destacando-se dentre eles os programas de rádio que nos últimos anos passaram a ser diários. Protagonizados pelo próprio médium, Luiz Gasparetto, nos últimos anos estes passaram a contar, às segundas-feiras, com a participação de Zíbia Gasparetto, mãe de Luiz, cuja presença tem sido uma constante nas listas dos livros de auto-ajuda ou não-ficção mais vendidos.
Essa duplicidade dos "espaços" e das atividades desenvolvidas – uma caracterizada como profissional, a outra como mediúnica – manteve-se por mais de uma década, tendo sido preservada, em larga medida, em função da restrição dos espíritas quanto à remuneração da atividade mediúnica.
Como outras já citadas, essa reinterpretação espírita da tradição cristã tem em Chico Xavier um modelo exemplar. Tensões crescentes em relação a esse modelo, moral e ético, levaram afinal a família Gasparetto ao rompimento com a prática institucional espírita, fato consumado em 1995, quando se decidiu encerrar as atividades do centro Os Caminheiros. Essa decisão, assumida publicamente como resultado da "orientação dos espíritos", abriu caminho para se promover, com mais liberdade, o uso da mediunidade com fins lucrativos. Um primeiro passo nessa direção fora dado anteriormente, quando se decidiu fechar a editora do centro Os Caminheiros. A abertura de um novo selo, desvinculado do centro, tornou possível a apropriação dos direitos autorais de livros psicografados, prática condenada na tradição espírita. "Podemos fazer uma mediunidade moderna", disse Gasparetto numa de suas palestras, sintetizando nessa fala a possibilidade do médium fazer uso da mediunidade visando o seu próprio bem-estar (inclusive financeiro), além de utilizá-la para a orientação dos indivíduos na solução de seus problemas cotidianos.
Esse afastamento do ideal kardecista da caridade caracteriza um deslizamento significativo com relação à tradição. A essa prática soma-se ainda, neste caso, a reintepretação da noção de karma de uma forma mais positiva, permitindo assim a passagem da ética da caridade – que implica a noção de doação como sacrifício – para a ética da prosperidade – tema do repertório neo-esotérico e de auto-ajuda, que tem como objeto a questão do bem-estar dos indivíduos, aqui e agora.
O percurso trilhado por Luiz Gasparetto descreve, portanto, um modo particular de produção da inovação da tradição espírita, sem implicar um total rompimento com esta, como no caso de Waldo Vieira. Isso porque o uso da mediunidade em moldes espíritas continua sendo a forma de produção da mediação entre este e o "outro mundo", prática religiosa que se mantém como fonte de autoridade das práticas e idéias que o grupo sustenta. Trata-se, portanto, de um outro modo de "ser espírita" menos convencional, menos constrangido pelo moralismo católico, mais afeito ao experimentalismo no que diz respeito ao uso de linguagens, de técnicas de comunicação, e mais voltado às questões de ordem psicológica.
Retomando, enfim, o argumento de início, esse "sistema de personagens" sugere serem diversos os modos de produção da fragmentação do campo espírita, que a colocam, cada um a seu modo, a tradição sob "riscos empíricos" (cf. Sahlins, 1990). Um dos resultados produzidos é o alargamento do campo das interlocuções estabelecidas: os casos apresentados sugerem um processo de redefinição das margens de trânsito, confronto e aliança, tanto dentro como fora do campo religioso. No que se refere ao aspecto da crítica ao sincretismo católico, este movimento se coaduna com o que alguns autores observam em relação a certos segmentos do Candomblé28. No entanto, as respostas apresentadas pelo Espiritismo parecem ter um espectro mais amplo, uma vez que estas incluem tanto projetos que visam o distanciamento completo de um viés religioso – caso dos grupos que, a exemplo de Waldo Vieira, buscam uma reaproximação da ciência , como grupos ou movimentos que buscam a renovação das idéias e práticas espíritas por meio do amálgama de possibilidades que oferece o chamado universo neo-esotérico. Desse segundo movimento emerge um aspecto inovador, que consiste na abertura de um novo campo de diálogo no interior do campo religioso, na medida em que o ideário da prosperidade se apresenta como moeda moral que agrega segmentos tradicionais e novos do campo religioso, dentre eles, certas correntes do universo neo-esotérico, do Espiritismo e das religiões neopentencostais, como a Igreja Universal do Reino de Deus.
RESUMO
O objetivo deste artigo é apresentar certas configurações recentes do Espiritismo no Brasil. Tomando como ponto de partida a bibliografia produzida sobre o tema, chama-se atenção, em primeiro lugar, para a omissão desta quanto às relações estabelecidas entre o Espiritismo e o Catolicismo; em seguida, deslocando o foco para a situação contemporânea, analisa-se as novas interlocuções que vêm sendo estabelecidas pelo Espiritismo como estratégia de inovação da doutrina. Baseada em estudos de caso, essa discussão se constitui em torno de três personagens – Chico Xavier, Waldo Vieira e Luiz Antonio Gasparetto –, os quais sintetizam, por meio de seus percursos pessoais, formas diversas de expressão e/ou contestação da "tradição" espírita
Sandra Jacqueline Stoll
Professora do Departamento de Antropologia – UFPR
Este é, portanto, um percurso que implica, como no caso anterior, em distanciamento da tradição, embora não configure, como no caso de Waldo Vieira, um total rompimento com o Espiritismo.
Os anos 80 constituem nesse caso o marco da mudança. Por essa época Luiz Gasparetto realizou uma série de viagens à Europa e aos Estados Unidos com a finalidade de promover a divulgação do Espiritismo. As sessões públicas de pintura mediúnica e programas de TV de que participou lhe permitiram observar a atuação de outros médiuns. Numa dessas viagens esteve também em Esalem, o centro new age da Califórnia (EUA), onde entrou em contato com idéias e práticas de diversos sistemas de conhecimento, especialmente com o então chamado "pensamento positivo" e técnicas de psicoterapia corporal. De volta ao Brasil, Luiz Gasparetto começou a se indispor com a Federação Espírita Brasileira. O alvo principal de suas críticas era dirigido ao moralismo espírita, manifesto, entre outros, no tratamento de certos temas, sexo e dinheiro, por exemplo.
Quando viajo para o estrangeiro e converso com os médiuns, os espíritos conversam abertamente de sexo e seus problemas. Aqui não. No Brasil nenhum espírito toca nesse assunto [...]. Aqui só dizem: "vai tomar passe, vai tomar passe!" [...] "apesar dos espíritos terem tentado passar uma mensagem libertadora, aqui os médiuns eram católicos e a linguagem que usaram era própria de sua estrutura mental. Passou o que foi possível. O resto ficou cheio de catolicismo. (Apud Stoll, 1999: 46)
Pouco tempo depois, aliando sua formação de psicólogo à experiência mediúnica, Luiz Gasparetto acabou criando um espaço alternativo de trabalho. Inaugurado em São Paulo nos anos 80, o Espaço Vida e Consciência passou a integrar o circuito dos espaços neo-esotéricos da cidade. Suas atividades regulares são cursos e palestras, às quais se somam shows e workshops, realizados eventualmente.
Por muitos anos Luiz Gasparetto se dividiu entre essas atividades e o exercício da prática da pintura mediúnica no centro Os Caminheiros, dirigido pela sua mãe, Zíbia Gasparetto. Por mais de dez anos a complementaridade definiu o trabalho realizado nesses dois espaços. Ou seja: no centro as atividades obedeciam ao padrão espírita tradicional (realização de sessões públicas de pintura mediúnica e aconselhamento; manutenção de uma creche a título de trabalho de caridade; destinação dos recursos financeiros, oriundos das atividades mediúnicas da família, para esta última); por sua vez, no Espaço Vida e Consciência, local definido como de exercício de atividade de cunho profissional, predominava a realização de atividades em caráter experimental, destacando-se entre estas, cursos e práticas voltados à questão da auto-ajuda. Com essa perspectiva Luiz Gasparetto explorou, nesse "espaço", as mais diversas linguagens. Além de novos usos dados à pintura mediúnica, como o de objeto de cenografia para seus shows, verifica-se a utilização de práticas discursivas diversas, incorporando-se ao seu repertório o uso da música, da expressão corporal, de técnicas de relaxamento e do psicodrama, bem como da representação teatral.
A divulgação das atividades desenvolvidas nesses dois "espaços" contou com recursos diversos de mídia, destacando-se dentre eles os programas de rádio que nos últimos anos passaram a ser diários. Protagonizados pelo próprio médium, Luiz Gasparetto, nos últimos anos estes passaram a contar, às segundas-feiras, com a participação de Zíbia Gasparetto, mãe de Luiz, cuja presença tem sido uma constante nas listas dos livros de auto-ajuda ou não-ficção mais vendidos.
Essa duplicidade dos "espaços" e das atividades desenvolvidas – uma caracterizada como profissional, a outra como mediúnica – manteve-se por mais de uma década, tendo sido preservada, em larga medida, em função da restrição dos espíritas quanto à remuneração da atividade mediúnica.
Como outras já citadas, essa reinterpretação espírita da tradição cristã tem em Chico Xavier um modelo exemplar. Tensões crescentes em relação a esse modelo, moral e ético, levaram afinal a família Gasparetto ao rompimento com a prática institucional espírita, fato consumado em 1995, quando se decidiu encerrar as atividades do centro Os Caminheiros. Essa decisão, assumida publicamente como resultado da "orientação dos espíritos", abriu caminho para se promover, com mais liberdade, o uso da mediunidade com fins lucrativos. Um primeiro passo nessa direção fora dado anteriormente, quando se decidiu fechar a editora do centro Os Caminheiros. A abertura de um novo selo, desvinculado do centro, tornou possível a apropriação dos direitos autorais de livros psicografados, prática condenada na tradição espírita. "Podemos fazer uma mediunidade moderna", disse Gasparetto numa de suas palestras, sintetizando nessa fala a possibilidade do médium fazer uso da mediunidade visando o seu próprio bem-estar (inclusive financeiro), além de utilizá-la para a orientação dos indivíduos na solução de seus problemas cotidianos.
Esse afastamento do ideal kardecista da caridade caracteriza um deslizamento significativo com relação à tradição. A essa prática soma-se ainda, neste caso, a reintepretação da noção de karma de uma forma mais positiva, permitindo assim a passagem da ética da caridade – que implica a noção de doação como sacrifício – para a ética da prosperidade – tema do repertório neo-esotérico e de auto-ajuda, que tem como objeto a questão do bem-estar dos indivíduos, aqui e agora.
O percurso trilhado por Luiz Gasparetto descreve, portanto, um modo particular de produção da inovação da tradição espírita, sem implicar um total rompimento com esta, como no caso de Waldo Vieira. Isso porque o uso da mediunidade em moldes espíritas continua sendo a forma de produção da mediação entre este e o "outro mundo", prática religiosa que se mantém como fonte de autoridade das práticas e idéias que o grupo sustenta. Trata-se, portanto, de um outro modo de "ser espírita" menos convencional, menos constrangido pelo moralismo católico, mais afeito ao experimentalismo no que diz respeito ao uso de linguagens, de técnicas de comunicação, e mais voltado às questões de ordem psicológica.
Retomando, enfim, o argumento de início, esse "sistema de personagens" sugere serem diversos os modos de produção da fragmentação do campo espírita, que a colocam, cada um a seu modo, a tradição sob "riscos empíricos" (cf. Sahlins, 1990). Um dos resultados produzidos é o alargamento do campo das interlocuções estabelecidas: os casos apresentados sugerem um processo de redefinição das margens de trânsito, confronto e aliança, tanto dentro como fora do campo religioso. No que se refere ao aspecto da crítica ao sincretismo católico, este movimento se coaduna com o que alguns autores observam em relação a certos segmentos do Candomblé28. No entanto, as respostas apresentadas pelo Espiritismo parecem ter um espectro mais amplo, uma vez que estas incluem tanto projetos que visam o distanciamento completo de um viés religioso – caso dos grupos que, a exemplo de Waldo Vieira, buscam uma reaproximação da ciência , como grupos ou movimentos que buscam a renovação das idéias e práticas espíritas por meio do amálgama de possibilidades que oferece o chamado universo neo-esotérico. Desse segundo movimento emerge um aspecto inovador, que consiste na abertura de um novo campo de diálogo no interior do campo religioso, na medida em que o ideário da prosperidade se apresenta como moeda moral que agrega segmentos tradicionais e novos do campo religioso, dentre eles, certas correntes do universo neo-esotérico, do Espiritismo e das religiões neopentencostais, como a Igreja Universal do Reino de Deus.
RESUMO
O objetivo deste artigo é apresentar certas configurações recentes do Espiritismo no Brasil. Tomando como ponto de partida a bibliografia produzida sobre o tema, chama-se atenção, em primeiro lugar, para a omissão desta quanto às relações estabelecidas entre o Espiritismo e o Catolicismo; em seguida, deslocando o foco para a situação contemporânea, analisa-se as novas interlocuções que vêm sendo estabelecidas pelo Espiritismo como estratégia de inovação da doutrina. Baseada em estudos de caso, essa discussão se constitui em torno de três personagens – Chico Xavier, Waldo Vieira e Luiz Antonio Gasparetto –, os quais sintetizam, por meio de seus percursos pessoais, formas diversas de expressão e/ou contestação da "tradição" espírita
Sandra Jacqueline Stoll
Professora do Departamento de Antropologia – UFPR
21 junho 2009
O DÍZIMO
Um questão interessante é que cada passagem bíblica sobre dízimo sempre contêm instruções cerimoniais. Agregados aos dízimos lá estão as ofertas alçadas, os bodes, os sacerdotes, os levitas, o templo, etc.
O dízimo não éra dinheiro, em coerência com todos os textos bíblicos sobre o assunto, o dízimo era alimento.
O povo trazia animais perfeitos para a casa do tesouro com três utilidades básicas: ser consumido pelo próprio dizimista perante o Senhor (Deut. 14:23), sustentar o clero (Num. 18:24) e socorrer os necessitados (Deut. 14:28,29).
Advertências ao clero sobre o dízimo aparecem em muitos trechos da Bíblia: "Filho do homem, profetiza contra os pastores de Israel... Ai dos pastores de Israel que se apascentam a si mesmos. Não apascentarão os pastores as ovelhas? Comeis a gordura e vestis-vos de lã. Degolais o cevado, mas não apascentais as ovelhas. A fraca não fortalecestes, a doente não curastes... a desgarrada não tornastes a trazer e a perdida não buscastes, mas dominais sobre elas com rigor e dureza... As minhas ovelhas andam desgarradas por todos os montes... Portanto, ó pastores, ouvi a palavra do Senhor..."
3 - Um garfo de tres pontas
Os defensores da doutrina do dízimo interpretam muito mal o texto das escrituras, afirmando que Casa do Tesouro corresponde à Igreja e que os dízimos são dez por cento das rendas pessoais.
Pode o homem comprar uma benção? É triste a situação daqueles que dão dez por cento de sua renda para uma igreja e fica aguardando por uma benção, geralmente de abastança.
A superstição é uma ferramenta perfeita nas mãos de líderes religiosos. Sempre foi assim. Na idade média as pessoas acreditavam que comprando indulgências iriam diretamente para o céu. Quanto dinheiro o clero medieval amealhou explorando a crendice supersticiosa de milhões de sinceros. Hoje líderes religiosos árabes enganam jovens humildes com a Doutrina da Guerra Santa. Eles criaram a superstição que garante o Céu aos que morrerem em combate. Ser um homem bomba suicida é passaporte garantido para o paraíso eterno.
Hoje, cristãos sinceros, deixam de comprar gêneros de primeira necessidade, dexam seu filhos sem leite e voltam à pé para casa, para pagar dízimos às suas igrejas. Põe dez por cento de seus salários num envelope, participam de correntes disso e daquilo, lançam-no na salva de ofertas e saem aliviados. "Agora Deus vai me abençoar. Já cumpri minha parte". A superstição é tão forte que alguns chegam a pagar dízimos com cheques pré-datados afim de se livrarem da maldição.
A superstição é a contramão da graça. A superstição manda cumprir exigências a fim de se livrar das conseqüências. A graça já nos fez conseqüências do amor de Deus. Ele tomou a iniciativa na cruz declarando que somos livres.
Na maioria das vezes o dizimista que mal alimenta seus filhos, instigado pela pregação tendenciosa que toma textos do Velho Testamento e através de um seqüestro cerebral cria uma base supersticiosa, é levado a contribuir para o alto salário do "Pastor" e com o luxo das igrejas. Não é ensinado que o dízimo biblico eram os dízimos aceitos somente em forma de animais e grãos como nos textos biblicos abaixo:
"Certamente darás os dízimos de todo o fruto das tuas sementes, que cada ano se recolher no campo. Perante o Senhor teu Deus, no lugar que ele escolher para ali fazer habitar o seu nome, comereis os dízimos do teu cereal, do teu vinho e do teu azeite, e os primogênitos das tuas vacas e das tuas ovelhas, para que aprendas a temer ao Senhor teu Deus todos os dias. Mas se o caminho for longo demais, de modo que não os possas levar, por estar longe de ti o lugar que o Senhor teu Deus escolher para ali pôr o seu nome, quando o Senhor teu Deus te tiver abençoado, então vende-os e leva o dinheiro na tua mão e vai ao lugar que o Senhor teu Deus escolher. Com esse dinheiro comprarás tudo o que deseja a tua alma, por vacas, ou ovelhas, ou vinho, ou bebida forte, ou qualquer outra coisa que te pedir a tua alma. Come-o ali perante o Senhor teu Deus, e alegra-te tu e a tua familia" Deuteronômio 14:22:29
"Trareis a este lugar os vossos holocaustos e os vossos sacrifícios, os vossos dízimos e as vossas ofertas especiais, os vossos votos e as vossas ofertas voluntárias, e os primogênitos das vossas vacas e das vossas ovelhas. Ali comereis na presença do Senhor vosso Deus e vos alegrareis com as vossas familias por todo o bem que vos abençoar o Senhor vosso Deus. Então, ao lugar que escolher o Senhor vosso Deus... para ali trareis.... vossos dízimos" Deuteronômio 12:6,7,11
Os dízimos deviam ser comidos pelos dizimistas na presença do Senhor, no local que Ele ordenasse. Na dificuldade de explicar este e outros textos onde Deus manda o próprio dizimista consumir seus dízimos, alguns pastores ignoram o texto, e de acordo com sua conveniencia, colocam outras doutrinas, numa atitude muito difícil de se sustentar, pois a Bíblia não as declara no contexto geral.
Em Números 18:23, 24, 31 lemos: "Mas os levitas farão o serviço da tenda da congregação, e levarão sobre si a sua iniquidade. Este será estatuto perpétuo pelas vossas gerações. No meio dos filhos de Israel nenhuma herança terão. Porque os dízimos dos filhos de Israel, que oferecerem ao Senhor em oferta alçada, dei-os por herança aos levitas, pois eu lhes disse: No meio dos filhos de Israel nenhuma herança terão. Vós e a vossa casa o comereis em todo o lugar, pois é vosso galardão pelo vosso serviço na tenda da congregação"
A primeira coisa a se observar neste texto tão utilizado pelos teólogos dizimistas hoje, é que os dízimos, destinados a sustentar os levitas, eram dados ao Senhor como oferta alçada. Porque a Bíblia condena a coerção nos destinos dos dízimos. (I Samuel 8:16 e 17; Isa 1:11-17; Amós 5:21-25; 8:10,11). Não havia nenhuma obrigatoriedade sistemática. A Bíblia não afirma que os dízimos eram exclusivamente para o sustentar o clero, mas também contribuíar para um maior equilíbrio social, pois todos os pobres comiam com o dizimista..
A Bíblia fala de três aplicações ao dízimo: O dízimo podia ser comido pelo dizimista. O dízimo deveria socorrer órfãos, viúvas e necessitados. O dízimo deveria alimentar os levitas. As opções do uso do dízimo autorizava o dizimista a comer seus próprios dízimos ou dá-los aos necessitados, nesta época os levitas representantes do clero (que não podiam erdar propriedades), estavam em igualdade social com os excluídos. Os órfãos, as viúvas e os pobres. Havia uma identificação do clero com as pessoas humildes. Pertenciam ao mesmo padrão social.
Nem todos os levitas atuavam em tempo integral ao sacerdócio, por isso vemos as instruções para os levitas em Número 18 e em Deuteronômio 14, que apenas quando em atuação no Templo estavam aptos a comer dos dízimos, juntamente com os órfãos e as viúvas.
Com o passar do tempo o uso dos dízimos foram deturpados tomando destino exclusivo para os levitas e sacerdotes.
Os dízimos entregues nas igrejas cristãs hoje estão anos-luz do ideal bíblico, sendo portanto espúrio, um verdadeiro estelionato sobre a fé alheia. Esse falsos mestres que assim procedem são como lobos devoradores entres as ovelhas, abusavam de sua condição de sacerdotes para obter parte das ofertas às custas do sacrificio dos necessitados, estão incorrendo nos pecados dos filhos de Eli o sumo sacerdote:
28 E eu o escolhi dentre todas as tribos de Israel para ser o meu sacerdote, para subir ao meu altar, para queimar o incenso, e para trazer o éfode perante mim; e dei à casa de teu pai todas as ofertas queimadas dos filhos de Israel.
29 Por que desprezais o meu sacrifício e a minha oferta, que ordenei se fizessem na minha morada, e por que honras a teus filhos mais de que a mim, de modo a vos engordardes do principal de todas as ofertas do meu povo Israel?
34 E te será por sinal o que sobrevirá a teus dois filhos, a Hofni e a Finéias; ambos morrerão no mesmo dia (I Samuel 2: 28,29,34).
Surge no denominacionalismo a figura do hipócrita social representando um papel que ele mesmo não crê. Líderes financistas, guardiães de um institucionalismo ferrenho, criado para perpetuar seus próprios interesses corporativistas, ludibriam multidões de sinceros.
Nossos dízimos hoje não tem nenhuma correlação com o dízimo bíblico. Não temos o Templo, nem os sacerdotes levitas (da tribo de Levi). Não vivemos numa sociedade teocrática. A lei cerimonial acabou. Não existe mais a "Casa do Tesouro", depósito central para aquela quantidade enorme de alimentos e animais.
4 - Conclusão
Nós cristãos não pedemos concordar com essa prática abusiva. A inteligência e a elevação espiritual de Jesus nos libertou de velhos dogmas. Os que buscam a Deus hoje o fazem em espírito e em verdade.
O dízimo é a nobreza do sentimento do amor, cabe a cada um contribuir de acordo com seu coração, com sua benção, daquilo que teve em abundancia, para que possa comer o próximo carente, para não haver na congregação o faminto e o necessitado. "Não com tristeza ou por necessidade, pois Deus ama o que dá com alegria". (II Cor. 9:7)
Onde está a vedadeira classe sacerdotal para dizer à igreja toda a verdade? "Mas vós desviastes do caminho e a muitos fizestes tropeçar..." (Mal 2:8).
A autonomia de ditar regras e percentuais, baseadas em manipulações tendenciosas de textos bíblicos fora do seu contexto original para amealhar renda ou riqueza, é uma abominação.
O homem de baixa renda que deveria receber de acordo com suas necessidades, geralmente nas igrejas ele contribui com dízimos e ofertas para salários que são muitas vezes maior que o seu. Os diaconos (lobos devoradores), falsos pastores recebendo muito à custa do sacrificio do pobre é um desrespeito as escrituras.
O dízimo não éra dinheiro, em coerência com todos os textos bíblicos sobre o assunto, o dízimo era alimento.
O povo trazia animais perfeitos para a casa do tesouro com três utilidades básicas: ser consumido pelo próprio dizimista perante o Senhor (Deut. 14:23), sustentar o clero (Num. 18:24) e socorrer os necessitados (Deut. 14:28,29).
Advertências ao clero sobre o dízimo aparecem em muitos trechos da Bíblia: "Filho do homem, profetiza contra os pastores de Israel... Ai dos pastores de Israel que se apascentam a si mesmos. Não apascentarão os pastores as ovelhas? Comeis a gordura e vestis-vos de lã. Degolais o cevado, mas não apascentais as ovelhas. A fraca não fortalecestes, a doente não curastes... a desgarrada não tornastes a trazer e a perdida não buscastes, mas dominais sobre elas com rigor e dureza... As minhas ovelhas andam desgarradas por todos os montes... Portanto, ó pastores, ouvi a palavra do Senhor..."
3 - Um garfo de tres pontas
Os defensores da doutrina do dízimo interpretam muito mal o texto das escrituras, afirmando que Casa do Tesouro corresponde à Igreja e que os dízimos são dez por cento das rendas pessoais.
Pode o homem comprar uma benção? É triste a situação daqueles que dão dez por cento de sua renda para uma igreja e fica aguardando por uma benção, geralmente de abastança.
A superstição é uma ferramenta perfeita nas mãos de líderes religiosos. Sempre foi assim. Na idade média as pessoas acreditavam que comprando indulgências iriam diretamente para o céu. Quanto dinheiro o clero medieval amealhou explorando a crendice supersticiosa de milhões de sinceros. Hoje líderes religiosos árabes enganam jovens humildes com a Doutrina da Guerra Santa. Eles criaram a superstição que garante o Céu aos que morrerem em combate. Ser um homem bomba suicida é passaporte garantido para o paraíso eterno.
Hoje, cristãos sinceros, deixam de comprar gêneros de primeira necessidade, dexam seu filhos sem leite e voltam à pé para casa, para pagar dízimos às suas igrejas. Põe dez por cento de seus salários num envelope, participam de correntes disso e daquilo, lançam-no na salva de ofertas e saem aliviados. "Agora Deus vai me abençoar. Já cumpri minha parte". A superstição é tão forte que alguns chegam a pagar dízimos com cheques pré-datados afim de se livrarem da maldição.
A superstição é a contramão da graça. A superstição manda cumprir exigências a fim de se livrar das conseqüências. A graça já nos fez conseqüências do amor de Deus. Ele tomou a iniciativa na cruz declarando que somos livres.
Na maioria das vezes o dizimista que mal alimenta seus filhos, instigado pela pregação tendenciosa que toma textos do Velho Testamento e através de um seqüestro cerebral cria uma base supersticiosa, é levado a contribuir para o alto salário do "Pastor" e com o luxo das igrejas. Não é ensinado que o dízimo biblico eram os dízimos aceitos somente em forma de animais e grãos como nos textos biblicos abaixo:
"Certamente darás os dízimos de todo o fruto das tuas sementes, que cada ano se recolher no campo. Perante o Senhor teu Deus, no lugar que ele escolher para ali fazer habitar o seu nome, comereis os dízimos do teu cereal, do teu vinho e do teu azeite, e os primogênitos das tuas vacas e das tuas ovelhas, para que aprendas a temer ao Senhor teu Deus todos os dias. Mas se o caminho for longo demais, de modo que não os possas levar, por estar longe de ti o lugar que o Senhor teu Deus escolher para ali pôr o seu nome, quando o Senhor teu Deus te tiver abençoado, então vende-os e leva o dinheiro na tua mão e vai ao lugar que o Senhor teu Deus escolher. Com esse dinheiro comprarás tudo o que deseja a tua alma, por vacas, ou ovelhas, ou vinho, ou bebida forte, ou qualquer outra coisa que te pedir a tua alma. Come-o ali perante o Senhor teu Deus, e alegra-te tu e a tua familia" Deuteronômio 14:22:29
"Trareis a este lugar os vossos holocaustos e os vossos sacrifícios, os vossos dízimos e as vossas ofertas especiais, os vossos votos e as vossas ofertas voluntárias, e os primogênitos das vossas vacas e das vossas ovelhas. Ali comereis na presença do Senhor vosso Deus e vos alegrareis com as vossas familias por todo o bem que vos abençoar o Senhor vosso Deus. Então, ao lugar que escolher o Senhor vosso Deus... para ali trareis.... vossos dízimos" Deuteronômio 12:6,7,11
Os dízimos deviam ser comidos pelos dizimistas na presença do Senhor, no local que Ele ordenasse. Na dificuldade de explicar este e outros textos onde Deus manda o próprio dizimista consumir seus dízimos, alguns pastores ignoram o texto, e de acordo com sua conveniencia, colocam outras doutrinas, numa atitude muito difícil de se sustentar, pois a Bíblia não as declara no contexto geral.
Em Números 18:23, 24, 31 lemos: "Mas os levitas farão o serviço da tenda da congregação, e levarão sobre si a sua iniquidade. Este será estatuto perpétuo pelas vossas gerações. No meio dos filhos de Israel nenhuma herança terão. Porque os dízimos dos filhos de Israel, que oferecerem ao Senhor em oferta alçada, dei-os por herança aos levitas, pois eu lhes disse: No meio dos filhos de Israel nenhuma herança terão. Vós e a vossa casa o comereis em todo o lugar, pois é vosso galardão pelo vosso serviço na tenda da congregação"
A primeira coisa a se observar neste texto tão utilizado pelos teólogos dizimistas hoje, é que os dízimos, destinados a sustentar os levitas, eram dados ao Senhor como oferta alçada. Porque a Bíblia condena a coerção nos destinos dos dízimos. (I Samuel 8:16 e 17; Isa 1:11-17; Amós 5:21-25; 8:10,11). Não havia nenhuma obrigatoriedade sistemática. A Bíblia não afirma que os dízimos eram exclusivamente para o sustentar o clero, mas também contribuíar para um maior equilíbrio social, pois todos os pobres comiam com o dizimista..
A Bíblia fala de três aplicações ao dízimo: O dízimo podia ser comido pelo dizimista. O dízimo deveria socorrer órfãos, viúvas e necessitados. O dízimo deveria alimentar os levitas. As opções do uso do dízimo autorizava o dizimista a comer seus próprios dízimos ou dá-los aos necessitados, nesta época os levitas representantes do clero (que não podiam erdar propriedades), estavam em igualdade social com os excluídos. Os órfãos, as viúvas e os pobres. Havia uma identificação do clero com as pessoas humildes. Pertenciam ao mesmo padrão social.
Nem todos os levitas atuavam em tempo integral ao sacerdócio, por isso vemos as instruções para os levitas em Número 18 e em Deuteronômio 14, que apenas quando em atuação no Templo estavam aptos a comer dos dízimos, juntamente com os órfãos e as viúvas.
Com o passar do tempo o uso dos dízimos foram deturpados tomando destino exclusivo para os levitas e sacerdotes.
Os dízimos entregues nas igrejas cristãs hoje estão anos-luz do ideal bíblico, sendo portanto espúrio, um verdadeiro estelionato sobre a fé alheia. Esse falsos mestres que assim procedem são como lobos devoradores entres as ovelhas, abusavam de sua condição de sacerdotes para obter parte das ofertas às custas do sacrificio dos necessitados, estão incorrendo nos pecados dos filhos de Eli o sumo sacerdote:
28 E eu o escolhi dentre todas as tribos de Israel para ser o meu sacerdote, para subir ao meu altar, para queimar o incenso, e para trazer o éfode perante mim; e dei à casa de teu pai todas as ofertas queimadas dos filhos de Israel.
29 Por que desprezais o meu sacrifício e a minha oferta, que ordenei se fizessem na minha morada, e por que honras a teus filhos mais de que a mim, de modo a vos engordardes do principal de todas as ofertas do meu povo Israel?
34 E te será por sinal o que sobrevirá a teus dois filhos, a Hofni e a Finéias; ambos morrerão no mesmo dia (I Samuel 2: 28,29,34).
Surge no denominacionalismo a figura do hipócrita social representando um papel que ele mesmo não crê. Líderes financistas, guardiães de um institucionalismo ferrenho, criado para perpetuar seus próprios interesses corporativistas, ludibriam multidões de sinceros.
Nossos dízimos hoje não tem nenhuma correlação com o dízimo bíblico. Não temos o Templo, nem os sacerdotes levitas (da tribo de Levi). Não vivemos numa sociedade teocrática. A lei cerimonial acabou. Não existe mais a "Casa do Tesouro", depósito central para aquela quantidade enorme de alimentos e animais.
4 - Conclusão
Nós cristãos não pedemos concordar com essa prática abusiva. A inteligência e a elevação espiritual de Jesus nos libertou de velhos dogmas. Os que buscam a Deus hoje o fazem em espírito e em verdade.
O dízimo é a nobreza do sentimento do amor, cabe a cada um contribuir de acordo com seu coração, com sua benção, daquilo que teve em abundancia, para que possa comer o próximo carente, para não haver na congregação o faminto e o necessitado. "Não com tristeza ou por necessidade, pois Deus ama o que dá com alegria". (II Cor. 9:7)
Onde está a vedadeira classe sacerdotal para dizer à igreja toda a verdade? "Mas vós desviastes do caminho e a muitos fizestes tropeçar..." (Mal 2:8).
A autonomia de ditar regras e percentuais, baseadas em manipulações tendenciosas de textos bíblicos fora do seu contexto original para amealhar renda ou riqueza, é uma abominação.
O homem de baixa renda que deveria receber de acordo com suas necessidades, geralmente nas igrejas ele contribui com dízimos e ofertas para salários que são muitas vezes maior que o seu. Os diaconos (lobos devoradores), falsos pastores recebendo muito à custa do sacrificio do pobre é um desrespeito as escrituras.
18 junho 2009
WALDO VIEIRA:entre a religião e a ciência
Conhecido no meio espírita pela produção de livros em co-autoria com Chico Xavier, Waldo Vieira realizou um percurso que pode ser balizado em dois momentos: o primeiro, aquele de sua juventude, compreende o período em que desenvolveu a prática mediúnica sob a liderança e na companhia de Chico Xavier; a ruptura com o Espiritismo, em meados dos anos 60, marca a segunda etapa, fase em que, depois de dedicar-se ao estudo da medicina, decide investir numa carreira solo, assumindo, alguns anos mais tarde, a liderança de um grupo voltado à prática de "experiências fora do corpo" (ou "viagem astral" como a denominam os espíritas). Conhecido pelo nome de Projeciologia, esse grupo fundado e liderado por Waldo Vieira teve o seu desenvolvimento desdobrado em duas fases: na primeira, segundo D'Andrea (1981) que realizou estudo de caso sobre o tema, predomina a construção carismática da imagem pública de sua liderança; a outra, mais recente, envolve a institucionalização e burocratização organizacional do grupo.
Assim como outras correntes que integram o universo das chamadas paraciências, a Projeciologia se caracteriza pela pretensão de promover uma síntese entre saberes científicos e não-científicos. Trata-se, portanto, da construção de um pensamento de cunho secular sobre fenômenos que, no senso comum, são tidos como próprios do domínio religioso. Neste caso, o objeto-alvo de produção de conhecimento é a experiência de consciência "fora do corpo físico".
Fundador do Instituto Internacional de Projeciologia e Conscienciologia, Waldo Vieira começou a divulgar sua experiência pessoal e conhecimentos sobre o tema por meio da realização de palestras públicas e da produção de livros. Os mais conhecidos dentre estes últimos foram lançados nas últimas décadas, com um intervalo de aproximadamente dez anos: Projeciologia: panorama das experiências da consciência fora do corpo humano foi publicado em 1986; 700 experimentos de Conscienciologia foi lançado em 1994. Nesse ínterim, entre uma publicação e outra, deu-se a institucionalização do movimento. Segundo D'Andrea esse processo foi conduzido por Waldo Vieira por meio da realização de cursos de treinamento, visando a formação de professores. Criando por meio desse expediente uma ampla rede de disseminadores de suas idéias, Waldo Vieira passou a ter nestes "profissionais" uma base para a disseminação de núcleos de estudo e pesquisa, os quais se encontram hoje espalhados no Brasil e no exterior.
Observa D'Andrea que esse processo de disseminação não atinge, contudo, a produção intelectual, que permanece sendo monopólio de seu fundador.
O estilo de liderança adotado é de tipo carismático: à semelhança de certos gurus indianos, Waldo Vieira usa uma vasta barba (branca), veste-se sempre de branco e ostenta, para além de traços distintivos de aparência, certos dons, dentre eles a mediunidade, a projetibilidade, a clarividência e a manipulação de energias para cura e materializações. A essas faculdades se soma ainda, como fator de distinção, a ostentação de sua condição de médico. A formação acadêmica serve nesse caso não apenas como fator de prestígio, mas, também, como suporte para a pretensão de cientificidade que reinvidica para a sua produção.
Com relação a esse último aspecto observa-se que a tentativa de aproximação do campo científico se realiza basicamente por meio de dois expedientes: 1) ênfase no experimentalismo, prática que envolve o desenvolvimento e a catalogação de técnicas de produção da projetibilidade, isto é, da capacidade de "sair do corpo"; e 2) investimento na construção de um universo conceitual singular. O rebuscamento lingüístico se apresenta como índice desse layout pretensamente científico, o qual se caracteriza pela criação de palavras, supostamente novas, que gradativamente vão sendo agregadas a um repertório cujo traço marcante é estar sempre em construção24. A própria mudança de denominação do grupo para Conscienciologia se insere nessa lógica. Sendo seu objetivo é expresso nos seguintes termos: trata-se de um movimento que visa o "estudo da consciência (a partir de uma) abordagem integral, holossomática, multidimensional, bioenergética, projetiva, autoconsciente e cosmoética" (D'Andrea, 2000: 164; destaques meus).
Concebido como "índice de racionalidade", esse investimento de ordem lingüística visa marcar, simbolicamente, o distanciamento de Waldo Vieira de outros sistemas de idéias, que operam essas mesmas práticas, tendo porém como fundamento orientações tradicionais, doutrinárias. O intenso investimento na organização burocrático-administrativa, implementada por ele especialmente nos últimos anos, tem esse mesmo sentido: os padrões de racionalidade, eficiência e profissionalismo adotados visam, dentre outros, marcar seu distanciamento do campo religioso25.
É interessante observar nessa trajetória a tendência à aproximação daquele que era o projeto de Allan Kardec, isto é, fazer do Espiritismo uma doutrina científica. Essa mesma intenção mobiliza Waldo Vieira com relação à Projeciologia, projeto que o distancia definitivamente da tradição espírita, em especial da interpretação religiosa consolidada sob a liderança de Chico Xavier. Como resultado tem-se, portanto, um deslizamento, isto é, a constituição de uma corrente dissidente, que assume como característica básica o deslocamento da ênfase no aspecto moral em favor do experimentalismo26.
Waldo Vieira sinaliza dessa forma um afastamento da tradição religiosa que marcou a sua iniciação. Os sinais diacríticos utilizados remetem simbolicamente à modernidade, cujo discurso tem na racionalidade um de seus valores fundamentais. Esses valores são explicitados de duas formas: por meio da produção discursiva e da ênfase que vem sendo dada nos anos mais recentes à organização burocrática.
Mini-biografia – Prof. Waldo Vieira
1932: Aos 9 anos inicia sua 1ª biblioteca. Aos 14 anos relaciona 50 fenômenos parapsíquicos e percebe a importância do desdobramento (Projeção). Aos 17 anos escreve outras conclusões e referências bibliográficas. Trabalha para manter os estudos em Odontologia e Medicina. Nesta época já escreve vários artigos e livros ligados ao movimento espírita.
1959-1966: Aos 28 anos, morando em Uberaba, dedica parte da residência para sua biblioteca, além do exercício da assistência social.
1966-1978: Sai do movimento espírita e volta-se para a pesquisa independente, indo morar no Rio de Janeiro.
1979: Lança o livro Projeções da Consciência – Diário de Experiências Fora do Corpo Humano.
1986: Lança o tratado Panorama das Experiências Fora do Corpo Humano, doado às maiores bibliotecas do mundo. Contém 1907 referências bibliográficas internacionais da Projeciologia. Com esta obra lançou a ciência Projeciologia.
1988: Funda o IIP – Instituto Internacional de Projeciologia, atual IIPC – Instituto Internacional de Projeciologia e Conscienciologia.
1994: Lança o tratado 700 Experimentos da Conscienciologia, onde fundamenta a ciência Conscienciologia.
1995: Funda o CEAEC – Centro de Altos estudos da Consciência, em Foz do Iguaçu, PR.
1996: Doa sua biblioteca ao CEAEC, concentrando ali a maior coleção do mundo especializada em Projeciologia.
2000: Muda-se para Foz de Iguaçu a fim de dedicar-se à realização da Enciclopédia da Conscienciologia.
2000: Funda a IAC – International Academy of Conscientiology, em Lisboa.
2001: É convidado pelo "International Biographical Center, Cambridge -England, para compor a lista de Intelectuais do Séc. XXI.
Assim como outras correntes que integram o universo das chamadas paraciências, a Projeciologia se caracteriza pela pretensão de promover uma síntese entre saberes científicos e não-científicos. Trata-se, portanto, da construção de um pensamento de cunho secular sobre fenômenos que, no senso comum, são tidos como próprios do domínio religioso. Neste caso, o objeto-alvo de produção de conhecimento é a experiência de consciência "fora do corpo físico".
Fundador do Instituto Internacional de Projeciologia e Conscienciologia, Waldo Vieira começou a divulgar sua experiência pessoal e conhecimentos sobre o tema por meio da realização de palestras públicas e da produção de livros. Os mais conhecidos dentre estes últimos foram lançados nas últimas décadas, com um intervalo de aproximadamente dez anos: Projeciologia: panorama das experiências da consciência fora do corpo humano foi publicado em 1986; 700 experimentos de Conscienciologia foi lançado em 1994. Nesse ínterim, entre uma publicação e outra, deu-se a institucionalização do movimento. Segundo D'Andrea esse processo foi conduzido por Waldo Vieira por meio da realização de cursos de treinamento, visando a formação de professores. Criando por meio desse expediente uma ampla rede de disseminadores de suas idéias, Waldo Vieira passou a ter nestes "profissionais" uma base para a disseminação de núcleos de estudo e pesquisa, os quais se encontram hoje espalhados no Brasil e no exterior.
Observa D'Andrea que esse processo de disseminação não atinge, contudo, a produção intelectual, que permanece sendo monopólio de seu fundador.
O estilo de liderança adotado é de tipo carismático: à semelhança de certos gurus indianos, Waldo Vieira usa uma vasta barba (branca), veste-se sempre de branco e ostenta, para além de traços distintivos de aparência, certos dons, dentre eles a mediunidade, a projetibilidade, a clarividência e a manipulação de energias para cura e materializações. A essas faculdades se soma ainda, como fator de distinção, a ostentação de sua condição de médico. A formação acadêmica serve nesse caso não apenas como fator de prestígio, mas, também, como suporte para a pretensão de cientificidade que reinvidica para a sua produção.
Com relação a esse último aspecto observa-se que a tentativa de aproximação do campo científico se realiza basicamente por meio de dois expedientes: 1) ênfase no experimentalismo, prática que envolve o desenvolvimento e a catalogação de técnicas de produção da projetibilidade, isto é, da capacidade de "sair do corpo"; e 2) investimento na construção de um universo conceitual singular. O rebuscamento lingüístico se apresenta como índice desse layout pretensamente científico, o qual se caracteriza pela criação de palavras, supostamente novas, que gradativamente vão sendo agregadas a um repertório cujo traço marcante é estar sempre em construção24. A própria mudança de denominação do grupo para Conscienciologia se insere nessa lógica. Sendo seu objetivo é expresso nos seguintes termos: trata-se de um movimento que visa o "estudo da consciência (a partir de uma) abordagem integral, holossomática, multidimensional, bioenergética, projetiva, autoconsciente e cosmoética" (D'Andrea, 2000: 164; destaques meus).
Concebido como "índice de racionalidade", esse investimento de ordem lingüística visa marcar, simbolicamente, o distanciamento de Waldo Vieira de outros sistemas de idéias, que operam essas mesmas práticas, tendo porém como fundamento orientações tradicionais, doutrinárias. O intenso investimento na organização burocrático-administrativa, implementada por ele especialmente nos últimos anos, tem esse mesmo sentido: os padrões de racionalidade, eficiência e profissionalismo adotados visam, dentre outros, marcar seu distanciamento do campo religioso25.
É interessante observar nessa trajetória a tendência à aproximação daquele que era o projeto de Allan Kardec, isto é, fazer do Espiritismo uma doutrina científica. Essa mesma intenção mobiliza Waldo Vieira com relação à Projeciologia, projeto que o distancia definitivamente da tradição espírita, em especial da interpretação religiosa consolidada sob a liderança de Chico Xavier. Como resultado tem-se, portanto, um deslizamento, isto é, a constituição de uma corrente dissidente, que assume como característica básica o deslocamento da ênfase no aspecto moral em favor do experimentalismo26.
Waldo Vieira sinaliza dessa forma um afastamento da tradição religiosa que marcou a sua iniciação. Os sinais diacríticos utilizados remetem simbolicamente à modernidade, cujo discurso tem na racionalidade um de seus valores fundamentais. Esses valores são explicitados de duas formas: por meio da produção discursiva e da ênfase que vem sendo dada nos anos mais recentes à organização burocrática.
Mini-biografia – Prof. Waldo Vieira
1932: Aos 9 anos inicia sua 1ª biblioteca. Aos 14 anos relaciona 50 fenômenos parapsíquicos e percebe a importância do desdobramento (Projeção). Aos 17 anos escreve outras conclusões e referências bibliográficas. Trabalha para manter os estudos em Odontologia e Medicina. Nesta época já escreve vários artigos e livros ligados ao movimento espírita.
1959-1966: Aos 28 anos, morando em Uberaba, dedica parte da residência para sua biblioteca, além do exercício da assistência social.
1966-1978: Sai do movimento espírita e volta-se para a pesquisa independente, indo morar no Rio de Janeiro.
1979: Lança o livro Projeções da Consciência – Diário de Experiências Fora do Corpo Humano.
1986: Lança o tratado Panorama das Experiências Fora do Corpo Humano, doado às maiores bibliotecas do mundo. Contém 1907 referências bibliográficas internacionais da Projeciologia. Com esta obra lançou a ciência Projeciologia.
1988: Funda o IIP – Instituto Internacional de Projeciologia, atual IIPC – Instituto Internacional de Projeciologia e Conscienciologia.
1994: Lança o tratado 700 Experimentos da Conscienciologia, onde fundamenta a ciência Conscienciologia.
1995: Funda o CEAEC – Centro de Altos estudos da Consciência, em Foz do Iguaçu, PR.
1996: Doa sua biblioteca ao CEAEC, concentrando ali a maior coleção do mundo especializada em Projeciologia.
2000: Muda-se para Foz de Iguaçu a fim de dedicar-se à realização da Enciclopédia da Conscienciologia.
2000: Funda a IAC – International Academy of Conscientiology, em Lisboa.
2001: É convidado pelo "International Biographical Center, Cambridge -England, para compor a lista de Intelectuais do Séc. XXI.
O QUE É "DÉJÀ VU"
Quem nunca teve a sensação de já ter passado por uma situação
que acaba de vivenciar? Como a psiquiatria e a doutrina espírita respondem a esta questão?
A expressão déjà vu é de origem francesa e pode ser traduzida como "já visto". Como já ter estado em um determinado lugar ou já ter vivido certa situação presente, quando na realidade isto não era de conhecimento anterior. Em alguns casos ocorre a habilidade de predizer os eventos que acontecerão em seguida, o que é denominado premonição. Outras vezes, a pessoa pode determinar o tempo exato e o local onde a experiência original ocorreu.
Quando pensamos já ter visto um filme, lido um livro, conhecido uma pessoa, estado em um lugar sem nunca ter ido neste local, ficamos confusos, com dúvida, e temos a sensação de uma experiência déjà vu. Porém o déjà vu clássico nos dá a sensação de estranheza, de estarmos vivenciando uma experiência do passado.
Hans Holzer, em seu livro Vida Além Vida, descreve o seguinte: "a maioria dessas experiências déjà vu pode ser explicada com base na precognição. Uma experiência é prevista e não é registrada na hora. Mais tarde, quando a experiência se torna uma realidade objetiva e a pessoa passa por ela, de repente lembra-se "em um piscar de olhos" que já a conhecia. Em outras palavras, a maioria das experiências déjà vu nada mais são do que incidentes precógnitos esquecidos. Contudo, existe uma pequena parte dessas experiências que não pode ser explicada dessa maneira. Entre elas está em ir a uma cidade ou a uma casa pela primeira vez e prever com exatidão como é a casa ou a cidade – a ponto até de conhecer os cômodos, os móveis, a disposição de objetos e outros detalhes que estão muito além do âmbito da precognição normal. (...) Em geral, as experiências precógnitas são parciais e enfatizam certos pontos notáveis, talvez alguns detalhes, mas nunca todo o quadro. Quando o número de detalhes lembrado torna-se muito grande, temos que desconfiar sempre de que se trata de lembranças de uma encarnação passada".
A explicação médica
Os psicólogos e psiquiatras explicam que o sistema de memória temporal – que nos informa a idade, a data dos acontecimentos memorizados - sofre um lapso e nos informa como se fosse antiga uma memória que na verdade foi armazenada centésimos de segundos antes. Ou seja, você tem a sensação de já ter estado em um lugar, e já esteve mesmo, mas dois centésimos de segundos atrás, e fica achando que foi ontem ou há uma semana ou até anos.
Em 1955, Wilder Penfield fez uma experiência em que estimulava eletricamente lóbulos temporais, encontrando um bom número de experiências de déjà vu. As estatísticas mostram que cerca de 30% da população já teve alguma experiência déjà vu. Porém, este fenômeno ocorre com mais freqüência em indivíduos com distúrbios neuropatológicos, como a esquizofrenia e a epilepsia. Há também uma predisposição maior por fatores não patológicos, como fadiga, estresse, traumas emocionais, excesso de álcool e drogas.
É um assunto muito interessante, considerada a forma como o fenômeno se processa. Há diversas teorias sobre esse fenômeno, como a psicodinâmica, reencarnação e sonhos, ilusão epiléptica, holografia, distorção do senso de tempo e transferência entre hemisférios cerebrais. Na psicodinâmica, Freud dizia que o déjà vu resultava da lembrança de desejos inconscientes ou fantasias do passado que eram ativadas pela situação presente. Também o déjà vu poderia ser uma autodefesa, ou seja, nosso inconsciente processava a informação de que aquilo já havia acontecido, por isto, não devia temer, pois já havia passado por aquela experiência anteriormente. Essa teoria não explica os casos de premonição, nem de lembranças de datas e locais onde ocorreram eventos no passado e que ninguém conhecia. Nas teorias que associam o déjà vu a sonhos ou desdobramento do espírito, onde o espírito teria realmente vivido estes fatos, livre do corpo, surgiriam as lembranças de encarnações passadas, o que levaria à rememoração na encarnação presente.
Na ilusão epiléptica, há a teoria do dr. John Jackson, que associa o déjà vu a um sintoma de epilepsia psicomotora, devido à grande incidência de casos de "déjà senti" entre os pacientes epilépticos.
A holografia seria a memória que pode ser armazenada no cérebro como holograma tridimensional, em que pequenas partes de uma figura podem ser utilizadas para reconstruir o todo. Segundo essa teoria, o déjà vu ocorreria quando uma peça de um holograma presente fosse coincidente com outra peça de um holograma no passado. Ou seja, você vê uma foto de uma determinada cidade; tempos depois, você esquece estas imagens e as deixa armazenadas na memória como um holograma. Algum dia, quando você visitar essa cidade da foto, poderá ocorrer um déjà vu, por você se sentir familiarizado com as imagens, sem recordar-se de onde elas vêm.
Estado de percepção alterado
A distorção do senso de tempo é quando sem ter entrado ainda no estado de consciência, percebemos a situação ao nosso redor. Dessa forma, o tempo parece ser maior do que o normal. Quando entramos no estado de consciência, a situação que já havíamos percebido no estado inconsciente parece-nos uma lembrança do passado. A transferência entre hemisférios cerebrais significa a transferência de informações entre os dois hemisférios do cérebro, que normalmente ocorre em alguns milésimos de segundos. Porém, se esse tempo aumentar para cerca de um minuto, o hemisfério não dominante receberá a informação duas vezes, sendo uma diretamente e outra do outro hemisfério. Dessa forma, ele terá a sensação que os eventos presentes já aconteceram no passado.
Há carência de publicações e depoimentos sobre este assunto. Um rapaz descreveu sua experiência déjà vu na internet, num site renomado. Ele conta que no passado já sofreu catalepsia e teve muito déjà vu, que duravam desde dois a quinze minutos. Ele diz que em uma determinada época de sua vida teve que sair do Brasil e foi trabalhar em um posto de gasolina em Portugal. Um dia chegou um caminhão para abastecer. Enquanto ele se dirigia até o cliente, ativou-se espontaneamente um dèjá vu. Ele sabia que era um processo bioquímico e estava convencido de que aquela cena já tinha acontecido. Ele também podia pensar que a única coisa que não tinha acontecido era justamente ele saber que era um déjà vu. Então, em frações de segundos, pensou: "ora, aqui estou eu mais uma vez com esta ‘coisa’. Vou aproveitar para fazer um teste: se o déjà vu for informação somente do passado que está sendo processada por vias não convencionais, eu não serei capaz de adivinhar a quantidade de óleo diesel que o cliente vai desejar". Após ter esse pensamento extremamente rápido, aquela própria sensação de que tudo aquilo já tinha acontecido, modificou-se e passou a incluir também a sensação de que o cliente iria querer 2.000 escudos de combustível. Lembrou-se, enquanto se aproximava do caminhão, de que aquela quantidade era muito improvável, devido ele já estar acostumado a abastecer no mínimo 5.000 escudos para aquele tipo de veículo pesado. Foi tudo muito rápido e o cliente pediu 2.000 escudos. A sensação de déjà vu continuou, com a idéia de que aquilo já tinha acontecido, com exceção de sua operação mental discursiva; ele sabia que aquilo era um déjà vu e ele tinha livre arbítrio para alterar, seja para confirmar ou para prever o evento seguinte. Ele comenta que seu acontecimento poderia ser interpretado de forma diferente por um terceiro observador porque poderiam argumentar de que houve uma adivinhação, porém, antes de atender o cliente, ele digitou os 2.000 escudos na máquina de combustível, de forma que isto não poderia ser interpretado mais como uma simples operação mental inversa, devido ao fato de que o evento real se concretizou no devir de outras pessoas sem estado de déjà vu.
Experiências com o déjà vu
Como achei interessante seu depoimento, pedi, via e-mail, mais explicações. Essa pessoa me respondeu o seguinte: "um aspecto importante que gostaria de observar é que por muito tempo estive atento à percepção desta ocorrência o suficiente para poder discriminar quando há somente um déjà vu e quando ocorre a possibilidade de adivinhação concreta em torno de eventos particulares. Isto é, quando o déjà vu ocorre há em minha consciência um ‘discurso livre’ cujas operações mentais permitem inferências antecipadas sobre eventos futuros. Por outras palavras, naquele estado há um discernimento concreto do que é a sensação imediata do ‘já visto’ e do que é pensamento on-line sobre qual evento vai efetivamente ocorrer no futuro independente do déjà vu".
Relatos interessantes são encontrados sobre esse fenômeno. Isso não quer dizer que todas as respostas serão encontradas, mas poderão ter uma visão mais ampla do fenômeno e analisar com mais precisão as teorias defendidas nesta experiência específica.
Voltemos ao livro de Hans Holzer, numa história em que ele descreve a experiência déjà vu de um soldado: "durante a Segunda Guerra Mundial, um soldado se viu na Bélgica. Enquanto seus companheiros se perguntavam como entrar em determinada casa em uma cidadezinha daquele país, ele lhes mostrou o caminho e subiu a escada à frente deles, explicando, enquanto subia, onde ficava cada cômodo. Quando, depois disso, lhe perguntaram se havia estado ali antes, ele negou, dizendo que nunca havia deixado seu lar nos Estados Unidos, e estava dizendo a verdade. Não conseguia explicar como, de repente, se vira dotado de um conhecimento que não possuía em condições normais".
Devemos ter cuidado para que uma ilusão não se confunda com uma experiência déjà vu. O termo déjà vu se tornou popular dando amplo sentido a tudo que nos parece familiar. A experiência déjà vu é muito profunda e o sentimento é de estranheza. Devem ser separadas, as teorias de reencarnação, sonhos ou desdobramentos, das teorias de desejos inconscientes, fantasias do passado, mecanismo de autodefesa, ilusão epiléptica, entre outras, para melhor discernimento do que realmente é um déjà vu e o que é apenas uma ilusão de nossa imaginação fértil.
Este artigo foi publicado na Revista Cristã de Espiritismo, edição 35
que acaba de vivenciar? Como a psiquiatria e a doutrina espírita respondem a esta questão?
A expressão déjà vu é de origem francesa e pode ser traduzida como "já visto". Como já ter estado em um determinado lugar ou já ter vivido certa situação presente, quando na realidade isto não era de conhecimento anterior. Em alguns casos ocorre a habilidade de predizer os eventos que acontecerão em seguida, o que é denominado premonição. Outras vezes, a pessoa pode determinar o tempo exato e o local onde a experiência original ocorreu.
Quando pensamos já ter visto um filme, lido um livro, conhecido uma pessoa, estado em um lugar sem nunca ter ido neste local, ficamos confusos, com dúvida, e temos a sensação de uma experiência déjà vu. Porém o déjà vu clássico nos dá a sensação de estranheza, de estarmos vivenciando uma experiência do passado.
Hans Holzer, em seu livro Vida Além Vida, descreve o seguinte: "a maioria dessas experiências déjà vu pode ser explicada com base na precognição. Uma experiência é prevista e não é registrada na hora. Mais tarde, quando a experiência se torna uma realidade objetiva e a pessoa passa por ela, de repente lembra-se "em um piscar de olhos" que já a conhecia. Em outras palavras, a maioria das experiências déjà vu nada mais são do que incidentes precógnitos esquecidos. Contudo, existe uma pequena parte dessas experiências que não pode ser explicada dessa maneira. Entre elas está em ir a uma cidade ou a uma casa pela primeira vez e prever com exatidão como é a casa ou a cidade – a ponto até de conhecer os cômodos, os móveis, a disposição de objetos e outros detalhes que estão muito além do âmbito da precognição normal. (...) Em geral, as experiências precógnitas são parciais e enfatizam certos pontos notáveis, talvez alguns detalhes, mas nunca todo o quadro. Quando o número de detalhes lembrado torna-se muito grande, temos que desconfiar sempre de que se trata de lembranças de uma encarnação passada".
A explicação médica
Os psicólogos e psiquiatras explicam que o sistema de memória temporal – que nos informa a idade, a data dos acontecimentos memorizados - sofre um lapso e nos informa como se fosse antiga uma memória que na verdade foi armazenada centésimos de segundos antes. Ou seja, você tem a sensação de já ter estado em um lugar, e já esteve mesmo, mas dois centésimos de segundos atrás, e fica achando que foi ontem ou há uma semana ou até anos.
Em 1955, Wilder Penfield fez uma experiência em que estimulava eletricamente lóbulos temporais, encontrando um bom número de experiências de déjà vu. As estatísticas mostram que cerca de 30% da população já teve alguma experiência déjà vu. Porém, este fenômeno ocorre com mais freqüência em indivíduos com distúrbios neuropatológicos, como a esquizofrenia e a epilepsia. Há também uma predisposição maior por fatores não patológicos, como fadiga, estresse, traumas emocionais, excesso de álcool e drogas.
É um assunto muito interessante, considerada a forma como o fenômeno se processa. Há diversas teorias sobre esse fenômeno, como a psicodinâmica, reencarnação e sonhos, ilusão epiléptica, holografia, distorção do senso de tempo e transferência entre hemisférios cerebrais. Na psicodinâmica, Freud dizia que o déjà vu resultava da lembrança de desejos inconscientes ou fantasias do passado que eram ativadas pela situação presente. Também o déjà vu poderia ser uma autodefesa, ou seja, nosso inconsciente processava a informação de que aquilo já havia acontecido, por isto, não devia temer, pois já havia passado por aquela experiência anteriormente. Essa teoria não explica os casos de premonição, nem de lembranças de datas e locais onde ocorreram eventos no passado e que ninguém conhecia. Nas teorias que associam o déjà vu a sonhos ou desdobramento do espírito, onde o espírito teria realmente vivido estes fatos, livre do corpo, surgiriam as lembranças de encarnações passadas, o que levaria à rememoração na encarnação presente.
Na ilusão epiléptica, há a teoria do dr. John Jackson, que associa o déjà vu a um sintoma de epilepsia psicomotora, devido à grande incidência de casos de "déjà senti" entre os pacientes epilépticos.
A holografia seria a memória que pode ser armazenada no cérebro como holograma tridimensional, em que pequenas partes de uma figura podem ser utilizadas para reconstruir o todo. Segundo essa teoria, o déjà vu ocorreria quando uma peça de um holograma presente fosse coincidente com outra peça de um holograma no passado. Ou seja, você vê uma foto de uma determinada cidade; tempos depois, você esquece estas imagens e as deixa armazenadas na memória como um holograma. Algum dia, quando você visitar essa cidade da foto, poderá ocorrer um déjà vu, por você se sentir familiarizado com as imagens, sem recordar-se de onde elas vêm.
Estado de percepção alterado
A distorção do senso de tempo é quando sem ter entrado ainda no estado de consciência, percebemos a situação ao nosso redor. Dessa forma, o tempo parece ser maior do que o normal. Quando entramos no estado de consciência, a situação que já havíamos percebido no estado inconsciente parece-nos uma lembrança do passado. A transferência entre hemisférios cerebrais significa a transferência de informações entre os dois hemisférios do cérebro, que normalmente ocorre em alguns milésimos de segundos. Porém, se esse tempo aumentar para cerca de um minuto, o hemisfério não dominante receberá a informação duas vezes, sendo uma diretamente e outra do outro hemisfério. Dessa forma, ele terá a sensação que os eventos presentes já aconteceram no passado.
Há carência de publicações e depoimentos sobre este assunto. Um rapaz descreveu sua experiência déjà vu na internet, num site renomado. Ele conta que no passado já sofreu catalepsia e teve muito déjà vu, que duravam desde dois a quinze minutos. Ele diz que em uma determinada época de sua vida teve que sair do Brasil e foi trabalhar em um posto de gasolina em Portugal. Um dia chegou um caminhão para abastecer. Enquanto ele se dirigia até o cliente, ativou-se espontaneamente um dèjá vu. Ele sabia que era um processo bioquímico e estava convencido de que aquela cena já tinha acontecido. Ele também podia pensar que a única coisa que não tinha acontecido era justamente ele saber que era um déjà vu. Então, em frações de segundos, pensou: "ora, aqui estou eu mais uma vez com esta ‘coisa’. Vou aproveitar para fazer um teste: se o déjà vu for informação somente do passado que está sendo processada por vias não convencionais, eu não serei capaz de adivinhar a quantidade de óleo diesel que o cliente vai desejar". Após ter esse pensamento extremamente rápido, aquela própria sensação de que tudo aquilo já tinha acontecido, modificou-se e passou a incluir também a sensação de que o cliente iria querer 2.000 escudos de combustível. Lembrou-se, enquanto se aproximava do caminhão, de que aquela quantidade era muito improvável, devido ele já estar acostumado a abastecer no mínimo 5.000 escudos para aquele tipo de veículo pesado. Foi tudo muito rápido e o cliente pediu 2.000 escudos. A sensação de déjà vu continuou, com a idéia de que aquilo já tinha acontecido, com exceção de sua operação mental discursiva; ele sabia que aquilo era um déjà vu e ele tinha livre arbítrio para alterar, seja para confirmar ou para prever o evento seguinte. Ele comenta que seu acontecimento poderia ser interpretado de forma diferente por um terceiro observador porque poderiam argumentar de que houve uma adivinhação, porém, antes de atender o cliente, ele digitou os 2.000 escudos na máquina de combustível, de forma que isto não poderia ser interpretado mais como uma simples operação mental inversa, devido ao fato de que o evento real se concretizou no devir de outras pessoas sem estado de déjà vu.
Experiências com o déjà vu
Como achei interessante seu depoimento, pedi, via e-mail, mais explicações. Essa pessoa me respondeu o seguinte: "um aspecto importante que gostaria de observar é que por muito tempo estive atento à percepção desta ocorrência o suficiente para poder discriminar quando há somente um déjà vu e quando ocorre a possibilidade de adivinhação concreta em torno de eventos particulares. Isto é, quando o déjà vu ocorre há em minha consciência um ‘discurso livre’ cujas operações mentais permitem inferências antecipadas sobre eventos futuros. Por outras palavras, naquele estado há um discernimento concreto do que é a sensação imediata do ‘já visto’ e do que é pensamento on-line sobre qual evento vai efetivamente ocorrer no futuro independente do déjà vu".
Relatos interessantes são encontrados sobre esse fenômeno. Isso não quer dizer que todas as respostas serão encontradas, mas poderão ter uma visão mais ampla do fenômeno e analisar com mais precisão as teorias defendidas nesta experiência específica.
Voltemos ao livro de Hans Holzer, numa história em que ele descreve a experiência déjà vu de um soldado: "durante a Segunda Guerra Mundial, um soldado se viu na Bélgica. Enquanto seus companheiros se perguntavam como entrar em determinada casa em uma cidadezinha daquele país, ele lhes mostrou o caminho e subiu a escada à frente deles, explicando, enquanto subia, onde ficava cada cômodo. Quando, depois disso, lhe perguntaram se havia estado ali antes, ele negou, dizendo que nunca havia deixado seu lar nos Estados Unidos, e estava dizendo a verdade. Não conseguia explicar como, de repente, se vira dotado de um conhecimento que não possuía em condições normais".
Devemos ter cuidado para que uma ilusão não se confunda com uma experiência déjà vu. O termo déjà vu se tornou popular dando amplo sentido a tudo que nos parece familiar. A experiência déjà vu é muito profunda e o sentimento é de estranheza. Devem ser separadas, as teorias de reencarnação, sonhos ou desdobramentos, das teorias de desejos inconscientes, fantasias do passado, mecanismo de autodefesa, ilusão epiléptica, entre outras, para melhor discernimento do que realmente é um déjà vu e o que é apenas uma ilusão de nossa imaginação fértil.
Este artigo foi publicado na Revista Cristã de Espiritismo, edição 35